O meu rio está a encaminhar-se decisivamente para a foz. Acontece com todos os rios quando estão prontos para abandonarem os meandros preguiçosos que tentam, em vão, criar as última raízes de sede pela vida que lhes foge. E então surgem as recordações.
Foi talvez um encontro fortuito.
Foi talvez um encontro preparado.
Quem pode saber?
Em princípio, os encontros começam todos por ser fortuitos. Com correr do tempo constata-se que o fortuito só tem de testemunho a palavra. Há por trás uma carga mística que o transfigura, uma confluência de tantas coincidências que me leva a acreditar que estes encontros já estavam destinados. Quanto ao desfecho, esse é um mistério insondável. Só mais tarde se saberá se o rio voltou para trás, à procura da sua nascente.
Depois de mais um encontro fortuito, já perto da foz, seguiram-se dias mais azuis do que o azul que tive um dia quando julguei ter descoberto o azul genuíno dos meus sonhos. Nesse tempo o rio ainda era jovem e as suas águas não receavam ultrapassar obstáculos tumultuosos. Com o passar dos dias tornou-se ainda mais impetuoso e deixou para trás o leito ideal que acabou por secar. Aventureiro como era, preferiu atravessar o desconhecido. Não foi boa ideia. Os dias azuis, mais azuis que o azul inimaginável têm sempre a face reversa. O azul vira cinzento, o rio continua a sua viagem acidentada até que se torna menos veloz sem dar conta que o peso dos seus dias acumulados ganhou outra dimensão. E então é demasiado tarde para apagar os momentos aventureiros e impetuosos dos tempos em que julgava ser imortal e tinha, portanto, todo o tempo do mundo para esperar por outros encontros fortuitos.
Hoje, o rio está a encaminhar-se decisivamente para a foz e os encontros fortuitos já não vêm ter comigo. Passam ao largo sem me verem e os longos dias azuis que tive são agora momentos fugazes. Visões que só deixam saudades dos tempos idos.
O meu saco de missões já não dá argumentos para o rio indolente sair do seu estado comatoso. Por mais que o incite, as águas agarram-se ao leito e ficam estagnadas, quase inertes, sem força para retomarem a caminhada que se alonga mas já não mostra o horizonte. E então surge a inevitável revolta.
Foi talvez um encontro fortuito.
Foi talvez um encontro preparado.
Quem pode saber?
Em princípio, os encontros começam todos por ser fortuitos. Com correr do tempo constata-se que o fortuito só tem de testemunho a palavra. Há por trás uma carga mística que o transfigura, uma confluência de tantas coincidências que me leva a acreditar que estes encontros já estavam destinados. Quanto ao desfecho, esse é um mistério insondável. Só mais tarde se saberá se o rio voltou para trás, à procura da sua nascente.
Depois de mais um encontro fortuito, já perto da foz, seguiram-se dias mais azuis do que o azul que tive um dia quando julguei ter descoberto o azul genuíno dos meus sonhos. Nesse tempo o rio ainda era jovem e as suas águas não receavam ultrapassar obstáculos tumultuosos. Com o passar dos dias tornou-se ainda mais impetuoso e deixou para trás o leito ideal que acabou por secar. Aventureiro como era, preferiu atravessar o desconhecido. Não foi boa ideia. Os dias azuis, mais azuis que o azul inimaginável têm sempre a face reversa. O azul vira cinzento, o rio continua a sua viagem acidentada até que se torna menos veloz sem dar conta que o peso dos seus dias acumulados ganhou outra dimensão. E então é demasiado tarde para apagar os momentos aventureiros e impetuosos dos tempos em que julgava ser imortal e tinha, portanto, todo o tempo do mundo para esperar por outros encontros fortuitos.
Hoje, o rio está a encaminhar-se decisivamente para a foz e os encontros fortuitos já não vêm ter comigo. Passam ao largo sem me verem e os longos dias azuis que tive são agora momentos fugazes. Visões que só deixam saudades dos tempos idos.
O meu saco de missões já não dá argumentos para o rio indolente sair do seu estado comatoso. Por mais que o incite, as águas agarram-se ao leito e ficam estagnadas, quase inertes, sem força para retomarem a caminhada que se alonga mas já não mostra o horizonte. E então surge a inevitável revolta.
Porque terá que ser negada a eternidade a alguém que nasceu e evoluiu com a quase certeza de ser eterno?
Foi bom enquanto durou o sonho. Foi bom enquanto imaginei que era imortal. Agora que caí em mim e admito que não controlo o meu rio indolente, resta-me a solidão e o frio premonitório da morte.
Foi bom enquanto durou o sonho. Foi bom enquanto imaginei que era imortal. Agora que caí em mim e admito que não controlo o meu rio indolente, resta-me a solidão e o frio premonitório da morte.
Esta solidão dói fundo. É como uma negritude fatal que cai de repente e nunca admite que chegou ao sítio errado e fora de tempo. Ou talvez esteja errado e este seja o tempo certo. Em boa verdade há sempre um tempo para nascer, um tempo para crescer, um tempo para amar, um tempo para esquecer, outro tempo para morrer. Deixem-me só neste dia em que a neblina está a envolver-me no seu abraço gélido. Deixem-me esquecer. Deixem-me viver até ao último minuto esquecido que estou a morrer.
Não sei o que quero apagar na memória. Há qualquer coisa importante para esquecer, mas parece que ainda não chegou o tempo. A formatação que tenho que executar ainda não deve avançar.
Então, e o amor?
É isso. Nunca tive a certeza que me tinhas amor. Nem, tão pouco, estou certo se te amei menos do que era possível amar. Se é que se pode quantificar o amor, a tal chama que arde sem... blá, blá, blá. Enganei-me ao admitir que vivemos no mesmo mundo o tempo todo. Principalmente quando vinha a noite dos sonhos e não sabias para onde ia. Mas eu sabia. Sim. Ofuscava as outras nossas noites de luar. E a verdade estava espelhada nos meus olhos e não querias ver. Mesmo assim perdoa-me, meu amor de ontem, se te traí nas viagens dos sonhos noturnos. De qualquer forma já não vale a pena ter recordações de arrependimento. A foz nunca esteve tão próxima e tu tão longe.
Sabes?, a vida é um jogo em que se vai perdendo e ganhando e nunca se volta atrás para fazer erase. Um jogo numa roleta que nunca mostra o número. Mas há dias em que custa muito perder. São aqueles dias como o de hoje em que estou para aqui a lamentar-me tendo por companhia a minha solidão. Sim, ela é minha porque perdi-te hoje.
Quem me pode garantir que esta solidão não és tu na presença?
E se fores tu, aquela que mais adorei e adoro, mesmo assim, deixa-me só, a falar com a minha solidão. Esta solidão que dói fundo.
Agora queria falar de uma coisa. Enganei-me ao admitir que vivemos o tempo todo no mesmo mundo. Esse mundo em que os teus afrontamentos e as colisões consequentes se foram sucedendo, tentando ofuscar as noites inolvidáveis de luar quando nos olhávamos e partíamos à descoberta sem, apesar de tudo, esboçarmos um avanço. Foi esse o erro, meu amor de ontem. Uma sensação de fracasso tão estranha que desejei vir cá para fora olhar-me a mim mesmo e tentar descobrir quem falhou.
E o que teria visto, acaso fosse possível?
Uma mão cheia de nada a mostrar um grande, grande amor que perdi. Perdi-te.
Aconteceu ontem ou vem continuando a acontecer?
Assim, mesmo que oiça a tua voz longínqua a dizer que me amas, imploro-te que me deixes ficar para aqui com a minha solidão, porque a minha solidão é a tua presença constante.
O que gostava muito era que tivesses conhecido o amor e nesse dia te entregasses a ele. Paciência. Há momentos da vida em que nem sequer mandamos em nós.
Podia ter acontecido de forma diferente nas noites de luar de que falei atrás?
Agora, que ficou tudo por dizer, então até amanhã, minha solidão. Encontramo-nos no sítio combinado. Quem chegar primeiro espera pelo outro.
«...»
Sim, dou-te razão. Não pode ser um encontro fortuito.
Poderá ser um encontro bem perto do horizonte de eventos de um qualquer buraco negro, sem hipótese de retorno, que nos levará certamente para um sítio onde não haja mais solidão nem possa lembrar-me que um dia conheci-te num daqueles encontros fortuitos que nunca mais serão esquecidos?

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