Aquela voz veio de muito perto. Foi soprada ao ouvido. Com toda a certeza. Exagero o meu. Outros casos temperaram as ditas certezas absolutas. Melhor será dizer que me pareceu. Não podia esquecer-me do caso do relógio falante. Ficou a dúvida para sempre.
«Aqui me tens.»Uma espécie de eco. Fiquei mais atento.
Estava sentado em frente à mesa oval, centenária, em mogno maciço e não havia ninguém presente. Nem no hall. Tinha acabado naquele momento de fazer uma experiência que consistia numa tentativa de chamar os espíritos. Apenas uma tentativa sem convicção. Na verdade não acreditava lá muito em espíritos. Ou isso de espíritos que só eram sugestões.
A chama vacilante da vela era propícia para despertar ilusões de vultos e ectoplasmas com pseudópodes, contornos difusos de corpos e outras coisas quejandas. Quanto aos cheiros, característicos de momentos como aquele, estavam ausentes, bem como os ruídos duvidosos. Na verdade, tudo normal.
Fiquei à espera. Desejava que acontecesse algo de insólito. Um desafio discreto.
«Falso alarme.» Pensei.
«Pressentes mal.»
Sobressaltei-me. Era o mesmo tom de voz. Levantei-me e olhei em volta.
«Onde estás?»
Afinal continuava enganado.
«Reconheceste-me?»
«Reconheceste-me?»
Ou não?
«Leva-me contigo só por uma noite. És mauzinho, Mário. Não foste nada correto comigo.»
Sempre era ela! Mas quem era ela?
«Isto não vai ser nada bom.» Admiti.
«Cuida de ti, Mário!»
Um silêncio ruidoso caiu sobre o silêncio que esmagava a sala. Desafiando o que quer que fosse que existisse do outro lado da porta, dei alguns passos tímidos. Um bofetão não estava excluído. Então resolvi passar a casa a pente fino. Debaixo das camas, nos roupeiros, na marquise. Nada. E também notei a ausência absoluta do ruído de correntes a serem arrastadas, de ectoplasmas e contornos difusos.
«Tenho que ver o que se passa comigo. O pior é que não posso atribuir ao vinho. Bebi pouco ao jantar.»
«Pois bebeste.»
«Mau, mau!»
«Não te zangues. Tem calma. Estou a preparar-te...»
«Já estou preparado há muito.»
E estava. O ano de 1987 foi exemplar no que dizia respeito à existência de fenómenos paranormais.
«Pronto. Aqui me tens.»
Senti-me mais leve do que o ar. Pareceu-me que levitava. Mas tudo não passava de impressões. Desci logo à Terra. Afinal era um simples mortal que passava por uma situação fora do comum e mais nada. Então, decidi-me a enfrentar o fenómeno. E vi-a. Ela estava a um metro de mim. Vinha vestida de branco. O cabelo castanho caía-lhe pelas costas. Os olhos, também eram castanhos.
«Queres beijar-me?»
Era verdade. Mas se era ela, gostava que tivesse sido noutros tempos, porque nunca beijei. E a culpa não foi minha. Agora, beijar um fantasma, mesmo que fosse ela, não estava no programa. E a propósito, contra o que seria de esperar não tinha sentido aqueles arrepios característicos a percorrerem-me o corpo de alto a baixo.
«É verdade. O pêndulo. Chamei-te noutros tempos. Não devia, pois não?»
«Sabes que estou sempre contigo. Mas não queres beijar-me? Talvez estejas receoso. Não tenhas receio. As histórias dos contactos com os espíritos não são sempre desagradáveis.»
Notei o tom rosado do rosto.
Seria macio?
«Não tenhas receio, Mário. Toca-me.»
Um pouco a medo, toquei no seu rosto. Só ao de leve.
«Então?, essas sensações?»
Insisti nas carícias e ela fechou os olhos. Aproximei-me mais até os nossos corpos se tocarem. Senti a sua respiração acelerada. Dei-lhe um beijo na testa.
«Não és meu pai!» reclamou.
Que fantasma era aquele que nada tinha a ver com os descritos nos livros da especialidade?
Não arrastava correntes, não transmitia frio, nem o rosto estava pálido, cor de cera..
«Deixa ver-te melhor.»
Foi então que a chama da vela se apagou e ficámos completamente às escuras.
«Espera um pouco que vou acender a luz.»
«Não!»
Mal dei dois passos na direção do interruptor, tropecei numa cadeira e estatelei-me no chão.
«Esta agora!»
Levantei-me de imediato e avancei, às apalpadelas, até à parede onde podia procurar o interruptor. A sala iluminou-se e fiquei a olhar, aturdido. Aquela não era a minha sala da mesa oval. Dum momento para o outro tinha ocupado um espaço desconhecido. Já não via a mesa oval em mogno nem tão pouco as cadeiras. Nem o fantasma, que, a existirem, mais apreciava.
Atravessei um corredor que continuava para a direita.
Onde estava a porta de saída?
A resposta foi imediata, mas não era a que queria.
«Que faz o senhor aqui?»
«Eu?»
«Sim. Estou a falar consigo.»
Era um indivíduo calvo, rosto cheio, de meia idade.
«Mas não é...?»
«Não sou quem?»
Procurava ganhar tempo.
«Cuida de ti, Mário!»
Um silêncio ruidoso caiu sobre o silêncio que esmagava a sala. Desafiando o que quer que fosse que existisse do outro lado da porta, dei alguns passos tímidos. Um bofetão não estava excluído. Então resolvi passar a casa a pente fino. Debaixo das camas, nos roupeiros, na marquise. Nada. E também notei a ausência absoluta do ruído de correntes a serem arrastadas, de ectoplasmas e contornos difusos.
«Tenho que ver o que se passa comigo. O pior é que não posso atribuir ao vinho. Bebi pouco ao jantar.»
«Pois bebeste.»
«Mau, mau!»
«Não te zangues. Tem calma. Estou a preparar-te...»
«Já estou preparado há muito.»
E estava. O ano de 1987 foi exemplar no que dizia respeito à existência de fenómenos paranormais.
«Pronto. Aqui me tens.»
Senti-me mais leve do que o ar. Pareceu-me que levitava. Mas tudo não passava de impressões. Desci logo à Terra. Afinal era um simples mortal que passava por uma situação fora do comum e mais nada. Então, decidi-me a enfrentar o fenómeno. E vi-a. Ela estava a um metro de mim. Vinha vestida de branco. O cabelo castanho caía-lhe pelas costas. Os olhos, também eram castanhos.
«Queres beijar-me?»
Era verdade. Mas se era ela, gostava que tivesse sido noutros tempos, porque nunca beijei. E a culpa não foi minha. Agora, beijar um fantasma, mesmo que fosse ela, não estava no programa. E a propósito, contra o que seria de esperar não tinha sentido aqueles arrepios característicos a percorrerem-me o corpo de alto a baixo.
«É verdade. O pêndulo. Chamei-te noutros tempos. Não devia, pois não?»
«Sabes que estou sempre contigo. Mas não queres beijar-me? Talvez estejas receoso. Não tenhas receio. As histórias dos contactos com os espíritos não são sempre desagradáveis.»
Notei o tom rosado do rosto.
Seria macio?
«Não tenhas receio, Mário. Toca-me.»
Um pouco a medo, toquei no seu rosto. Só ao de leve.
«Então?, essas sensações?»
Insisti nas carícias e ela fechou os olhos. Aproximei-me mais até os nossos corpos se tocarem. Senti a sua respiração acelerada. Dei-lhe um beijo na testa.
«Não és meu pai!» reclamou.
Que fantasma era aquele que nada tinha a ver com os descritos nos livros da especialidade?
Não arrastava correntes, não transmitia frio, nem o rosto estava pálido, cor de cera..
«Deixa ver-te melhor.»
Foi então que a chama da vela se apagou e ficámos completamente às escuras.
«Espera um pouco que vou acender a luz.»
«Não!»
Mal dei dois passos na direção do interruptor, tropecei numa cadeira e estatelei-me no chão.
«Esta agora!»
Levantei-me de imediato e avancei, às apalpadelas, até à parede onde podia procurar o interruptor. A sala iluminou-se e fiquei a olhar, aturdido. Aquela não era a minha sala da mesa oval. Dum momento para o outro tinha ocupado um espaço desconhecido. Já não via a mesa oval em mogno nem tão pouco as cadeiras. Nem o fantasma, que, a existirem, mais apreciava.
Atravessei um corredor que continuava para a direita.
Onde estava a porta de saída?
A resposta foi imediata, mas não era a que queria.
«Que faz o senhor aqui?»
«Eu?»
«Sim. Estou a falar consigo.»
Era um indivíduo calvo, rosto cheio, de meia idade.
«Mas não é...?»
«Não sou quem?»
Procurava ganhar tempo.
«Deixe-se de lérias e não se desvie da questão. O que faz aqui?»
Não sabia o que dizer.
«Eu só queria encontrar a saída.»
O homem levou a mão ao bolso das calças. Puxou do lenço e assoou-se ruidosamente.
«Esta é a minha casa!»
Observei melhor o seu rosto. Nada me dizia.
«Olhe, o melhor é indicar-me a saída. Não sei como apareci aqui.»
Não sabia o que dizer.
«Eu só queria encontrar a saída.»
O homem levou a mão ao bolso das calças. Puxou do lenço e assoou-se ruidosamente.
«Esta é a minha casa!»
Observei melhor o seu rosto. Nada me dizia.
«Olhe, o melhor é indicar-me a saída. Não sei como apareci aqui.»
Estaria no outro lado da porta?
«É crime invadir propriedade privada.»
«Só quero encontrar a saída. Deve ser por essa porta por onde o senhor entrou.»
A porta estava entreaberta.
«E como entrou você?»
«Quer que lhe diga? Não vai acreditar.»
«Está bem, mas conte o que aconteceu.»
«Tinha faltado a luz na minha casa de jantar» comecei, sem me referir à sessão espírita. «De repente acendeu-se a luz e vi-me nesta casa. Mais nada. Não sei como cheguei aqui!»
«Essa história não tem pés nem cabeça. Talvez a polícia entenda melhor a coisa do que eu.»
Pegou no telemóvel e ato contínuo dei-lhe um empurrão forte que o atirou ao chão. Aproveitei o momento para esgueirar-me para fora da porta. Hesitei entre usar o elevador e descer pela escada de serviço. Achei melhor a última opção, não sem antes ter olhado para trás. Felizmente que o homem não me seguiu. Talvez tivesse ficado atordoado com a queda.
Só respirei fundo quando cheguei ao exterior.
Chovia copiosamente. Mesmo assim, fiz-me ao caminho. Mas não sabia onde estava.
«É crime invadir propriedade privada.»
«Só quero encontrar a saída. Deve ser por essa porta por onde o senhor entrou.»
A porta estava entreaberta.
«E como entrou você?»
«Quer que lhe diga? Não vai acreditar.»
«Está bem, mas conte o que aconteceu.»
«Tinha faltado a luz na minha casa de jantar» comecei, sem me referir à sessão espírita. «De repente acendeu-se a luz e vi-me nesta casa. Mais nada. Não sei como cheguei aqui!»
«Essa história não tem pés nem cabeça. Talvez a polícia entenda melhor a coisa do que eu.»
Pegou no telemóvel e ato contínuo dei-lhe um empurrão forte que o atirou ao chão. Aproveitei o momento para esgueirar-me para fora da porta. Hesitei entre usar o elevador e descer pela escada de serviço. Achei melhor a última opção, não sem antes ter olhado para trás. Felizmente que o homem não me seguiu. Talvez tivesse ficado atordoado com a queda.
Só respirei fundo quando cheguei ao exterior.
Chovia copiosamente. Mesmo assim, fiz-me ao caminho. Mas não sabia onde estava.
«E agora?»
Não me preocupei. Acabaria por encontrar o caminho de regresso.
De tudo o que me aconteceu após ter feito aquela estúpida sessão espírita só ficou uma dúvida;
Tocar nos fantasmas dava ou não dava uma sensação de frio?
De tudo o que me aconteceu após ter feito aquela estúpida sessão espírita só ficou uma dúvida;
Tocar nos fantasmas dava ou não dava uma sensação de frio?

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