Contam que no céu da noite, a muitos anos-luz de distância brilhava uma estrela numa galáxia escondida no universo em expansão a caminho de um futuro perdido para lá do tempo.
Num certo planeta azul, um homem solitário sondava a noite no céu da galáxia e procurava o passado, mas o universo expandia-se em anos-luz e anos-luz, submetido à força poderosa da energia escura, afastando-se cada vez mais da sua própria infância.
O homem solitário procurava uma estrela já fria, invisível, que o passado talvez tivesse tragado, enquanto a estrela que brilhava não chegava aos seus olhos cegos e obcecados pela recordação de um passado marcante, agora inatingível. A estrela não desistia de brilhar, cada vez com um brilho mais intenso, no limiar do perigo de se transformar numa etérea, bela e maravilhosa supernova. O risco era grande, mas ela insistia na intensidade do seu brilho. Talvez que chamasse a atenção do homem. E brilhou tanto, tanto, que uma noite o homem, virado sempre para o céu, descobriu a estrela.
«És bela! Antares. Betelgeuse. Vega. Quem quer que seja o teu nome, vou apaixonar-me por ti...»
«Ah!, finalmente!» exclamou a estrela, brilhando de felicidade.
«Mas não prometo nada. Sabes muito bem que não há amor como o primeiro!»
«Eu sei. Não faz mal...»
Contam ainda que a estrela e o homem estavam destinados a fundirem-se e a mergulharam juntos na eternidade sideral, até que o frio os congelasse. Mas contam também que, no momento em que o homem se esqueceu da estrela que deixou de brilhar e fixou o olhar na outra, esta, feliz, brilhou ainda mais, agora com a luminosidade de cem mil sóis e explodiu numa supernova fatalmente grandiosa. E foram dias de paixão intensa. E foram dias inesquecíveis que se aproximaram da eternidade do amor de um homem por uma mulher. E foram também dias de céu azul no negrume do espaço sideral. Dias muito intensos, mas que não conseguiram parar o tempo. Até que a estrela (Antares, Betelgeuse, Vega) viu chegar o tempo de deixar de brilhar. transformando-se numa minúscula estrela, cada vez mais distante e voltada para o seu espaço de influência. Nem o seu rodar alucinante, emitindo sinais como se fosse um farol, chegou ao apaixonado.
«Quem teve o desplante de esconder-te, minha estrela?»
«Eu estou aqui...» Disse, num sussurro, a estrela.
«Quem a matou?»
«Eu estou aqui!» repetiu, alucinada.
Mas onde estava a estrela que tanto o encantou?
Estava lá. No mesmo sítio. Agora transformada numa minúscula estrela. Uma estrela a que os homens da ciência deram o nome de pulsar. Uma estrela de neutrões muito densa, poderosa, e de dimensões ínfimas. Uma estrela pulsante que o homem sentia, mas que não conseguiu ver. Tinha a força colossal que a gravidade lhe deu, malgrado a pequenez das suas dimensões em comparação com a sua progenitora. Era densa, muito forte, mas já não o podia alcançar. Continuava lá, a muitos anos-luz de distância; e agora os seus sentimentos eram outros. De ambição. De poder. Emitia radiações invisíveis aos olhos do homem que, incrédulo e desesperado, começou a desistir, dia após dia, de a procurar.
Isto é o que contam, porque, do que contam, algo ficou ainda por contar.
Quanto ao homem que olhava para as estrelas, continuou a erguer os olhos para o céu da noite, esqueceu a última paixão e recomeçou a procurar...
E foi aí que algo ficou por contar.
Será verdade que ele procurava a primeira estrela a nascer no seu universo jovem, ou a outra estrela que tanto o encantou e deixou de brilhar?
Não sei o que aconteceu. E se aconteceu, foi uma história que ficou por contar.
Quanto a mim, também utopista das estrelas, acredito que ainda hoje são visíveis as "radiações de fundo" da paixão primordial.
(Vieste vestida de azul despertar a madrugada da supernova em letargia e o teu corpo sussurrou-me promessas eróticas. Sonhei que não tinha amarras
e que os teus lábios rubros
abriam o caminho escondido que me
fora proibido. Até que aconteceu aquilo. Tivemos o mesmo sonho naquela noite.
Fugias de uma tempestade e eu
acolhia-te nos os meus braços...
Depois, a supernova brilhou
com a luz de cem mil sóis,
feliz de agonizar!)


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