terça-feira, 4 de junho de 2024

O toque



A tua pele macia guarda segredos que me tornam refém de desejos inconfessáveis. Sinto no ar a presença de feromonas embriagantes que não deixam a mínima margem de manobra. Tento contrariar a força da razão e  encontrar um motivo lógico para o determinismo centrípeto que me faz colidir com a muralha que envolve os teus lábios finos com sabores a ardências contagiantes. O cálice dos impulsos transborda e já não pode impedir o gotejar lento do teu sabor nectarino até ao chão, onde jazem esquecidas as moldagens dos nossos corpos abraçados num frenesim de orgasmos que o vento suão trouxe e logo levou.
Os teus cabelos curtos e suaves, searas loiras que ondulam ao vento do capricho, estão prontos a receber o momento há muito desejado, esse toque erótico das mãos que os procuram.
Os meus olhos mergulham no verde-esperança dos teus e interrogam-se se estou na outra parte da vida onde comanda o sonho e se amanhã acordo no mundo que fala de tédio que preenche uma tela coberta há muito de desencantamento e negrume. Eles dizem que não, mas o mergulho no sonho que comanda a vida é tão real como o mergulho no vazio.
Existes em mim a todo o momento. Amo-te em silêncio. Chamo-te para o meu aconchego. Estendo a mão à procura do teu corpo no momento em que os relógios do tempo certo dão-me a incerteza de estar a acontecer o mesmo que acontece quando, às vezes, os consigo parar. Não sei se és minha quando te tenho minha. Se o pensamento vem da razão ou de uma origem mais profunda onde o desejo aproxima o momento do toque suave que está quase a acontecer no campo de batalha em que os peões, guarnecidos de alta cavalaria sedenta de vitória, avançam e chocam, no campo oposto, com os cavalos e as torres. Não interessa se estás sempre comigo. Para o diabo os pruridos, porque a força do desejo aperta, aperta cada vez mais o círculo que nos contém. Não importa o campo pejado de corações caídos por motivos resultantes de relações semelhantes às nossas. Nem sequer servem de obstáculo porque seremos sempre diferentes.
A emoção está a aflorar e a romper num sentimento com um só sentido. Ou agora ou nunca. A mão avança e os dedos mexem-se dentro da tua blusa, tocando no corpo suave e gostoso.
Ah!, meu amor ... parece que está a chegar o momento do toque. Só que estou hesitante. O diamante em bruto, antes que o artista o talhe, tem que ser visto e revisto até que este descubra como podem surgir as faces mais favoráveis para que ele brilhe com todo o esplendor e rebrilhe mostrando as faces supremas da pureza. Se falhar, paciência, artista. Tudo voltará ao princípio. A busca incessante do toque no longo campo de sonhos, onde se sente no ar a presença indelével do perfume da dama da noite, sempre misteriosa, invisível aos primeiros olhares de quem passa perto e sentido à distância..
Quero sentir o toque!
Tenho-te na minha frente e tu rodas graciosamente, brilhas cá dentro, acendes luzes, mostras caminhos, trazes contigo sonhos há muito imersos. Rodas e voltas a rodar até que ficas imóvel, à distância de estender o braço. Os teus olhos parecem dizer que sim. O corpo estremece e entrega-se numa dádiva total. Então somos um só até que, inevitavelmente, o desejo esmorece, para voltar mais logo, amanhã e sempre, quando quisermos. Não é o toque, mas o amor que é assim. Faz-nos felizes se acontece. Faz-nos tristes se arrefece. Mas não é ainda o toque, outra coisa bela como o amor, diferente do amor e que não pode acontecer sem a sua presença. O toque é o toque. Não sei explicar como é. Por mais que tente, não consigo. Faltam as palavras certas que o retratem.
Quando falo dele, não me refiro aos toques, às carícias que trocamos. O toque escurece a razão e existe no luar banhando com magia um oceano em bruto que nos ofusca com o brilho de mil sóis. O toque é talvez uma coisa ao mesmo tempo estranha e simples. É um momento mais breve e poderoso que um orgasmo. Um momento que acontece sem avisar, que acontece e não se explica, que surge com a intensidade do odor da dama da noite, um perfume exalado que nos toca e embriaga o próprio ar.
Este toque que procuro é mais veloz do que a própria luz. Talvez já o tenha sentido sem saber. Talvez não avise quando aparece. Talvez parta mesmo antes de chegar. Talvez nunca haja um dia em que venha para ficar.
O toque é, enfim, a ternura infinita que emana de ti e me faz sonhar.

Bendita sejas... porque um dia me tocaste! 

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