Eras pura como um lago de águas cristalinas onde os meus olhos se banhavam em cada momento que estava contigo. Foi há muito tempo. Não sei como nem porquê, mas ainda me lembro. Hoje esta recordação veio ter comigo mais uma vez. É estranho. Julgo que também já aconteceu ver o teu olhar doce noutro tempo e noutro espaço. Sim. Já aconteceu. Era outro tempo. É bom recordar, embora não haja solução para voltar a acontecer o momento.
No lançamento de um dado a probabilidade de sair um seis é a mesma do que a de sair outro número, de um a cinco. Mas o seis pode sair duas ou mais vezes seguidas. Já o mesmo não acontece com o momento que tivemos e que ficou perdido no passado. Primeiro, porque a máquina de viajar no tempo ainda não foi inventada. Segundo, porque se fosse possível viajar no tempo era cem por cento improvável acontecer esse momento tal como o senti. Assim, fecho os olhos e tento recordar o momento. Deixo passar alguns segundos e volto a fechar os olhos. Outra vez. Mais outra. Tal como os acontecimentos da vida real, nenhum dos momentos recordados é igual ao outro. Nem sei qual deles mais se aproxima do momento que quis recordar. Só mais uma vez. Pode ser que agora tenha sorte. E ainda outra. Como foi…? É impossível trazê-lo, tal como foi, à luz do dia. Mesmo que tivesse sido filmado, por mais vezes que visse o filme não conseguia senti-lo como o senti.
E que sono é este que me tomou assim, tão de repente?
Não consigo resistir. Fecho os olhos e adormeço quase de imediato. Vejo na minha frente o lago de águas cristalinas onde os meus olhos se banhavam todos os segundos em que estava contigo. E assim, vejo-te. És tu a emergir das águas cristalinas. Puras como tu eras no momento e nos momentos em que estávamos juntos.
Não quero acreditar que esteja a acontecer esse sorriso. Sei que estou a sonhar, mas não importa. Embora não esteja a acontecer, a verdade é que sorris para mim. Como és bela! E fico por aqui. Na contemplação. Sonho ou realidade continuas a sorrir para mim. Mas a tristeza que se espelha nos teus olhos lembra-me uma verdade que já esqueci e não quero recordar. Dizes que não. Que eles já eram tristes antes de me conheceres. Porquê? Porque sim, respondes se pudesses responder. É o que penso. A imaginação humana não tem limites. Portanto, a tristeza espelhada nos teus olhos nada tinha a ver comigo. Volto a perguntar. Receio que a tua bondade esteja a esconder a verdade. Sei que errei. Mas para quê o arrependimento se este não traz qualquer solução porque o tempo avança e não recua. Aconteceu. Já passou. O momento também. Não consigo trazê-lo à luz do dia.
Como assim? Talvez vá acontecer num outro universo paralelo?
É provável. Aposto que sim. Ainda bem que acreditas na existência de universos paralelos. Aí estão a acontecer destinos diferentes depois daquele momento. Ah! O momento só pode ter acontecido uma vez. Há um número infinito de universos paralelos e em cada um deles aconteceu a continuação sempre diferente daquele momento. Quero crer que sim.
Voltei a ver-te tempos depois do momento. Infelizmente as nossas vidas já corriam em estradas paralelas. Mesmo assim, sonhei durante algumas horas. Tu sabes disso. Depois, por mais voltas que dê a esta cabeça tonta e envelhecida não consigo entender porque aconteceu aquilo. Esqueci-me daquele momento e deixei que o meu tempo corresse mais livre que um cavalo à solta. Até que um dia me disseram que partiste na tua viagem sem regresso que todos faremos quando chegar o dia.
Compraste o bilhete antes do tempo certo?
É proibido saber. Já sei. Ponto final. Não avanço mais.
Quase num sussurro dizes que ainda és minha. Não pode ser. Não acredito. Foste minha e hoje já não és. Não posso ter-te na morte. Nem sequer em pensamento. Mas quero ouvir outra vez a tua voz. Aconteceu em muitos universos, mas não sei nada dos mistérios dos portais para poder encontrar-te pelo menos num deles. É trágico estar longe de ti e sentir a tua proximidade. Desesperante. Mas insisto. Se estás próxima, fala-me ao ouvido. Deixa que sinta nele a carícia dos teus lábios húmidos. O teu odor. A tua voz. Diz. Diz outra vez. Não te canses de dizer que não me esqueceste. Que me amas e sempre amaste. Que me perdoaste. Que não adormeci e estou a sonhar.
Não sabes se vais perdoar-me. Tens receio de cometer um erro. Fugi cobardemente e não quis saber de ti. Magoei-te. Sei tudo isso e estou arrependido. Não. Não podes perdoar-me. Escuta. Depois de todos estes anos de ausência voltei para ti. Só para ti. Para compensar o tempo que perdemos.
Não é tarde, pois não, cadáver?
Vem. Vem aninhar-te nos meus braços. Isso. Assim. Como fazias no tempo do momento. Nos nossos momentos. Mais que dantes, te amarei. Era a canção que cantava para ti. Lembras-te? Parece que sim. Então, deixa que te beije. Acontecia sempre assim depois de cantar para ti. Primeiro eras tu que me beijavas? Não me lembro. Talvez não tenha sido assim. Foi há muito tempo. Que frio está o teu corpo, meu amor! Muito frio. Talvez esteja a sonhar. Mas não quero que te afastes. Aninha-te mais para te aquecer. Como assim? Estou mais frio que tu? É uma ilusão. Tudo isto não passa de uma ilusão. O momento que existiu nada se pareceu com este. Que frio!, que solidão! Não te sinto. Tenho que acordar deste sonho gelado.
Já não vale a pena?
Não há universos paralelos. Agora dizes que não há universos paralelos e assim aquele momento não continuou. É o que pensas agora. Foi só um momento que ficou suspenso no passado.
Apenas passaste por aqui, dizes. Não entendes porque estou a perder tempo com esta obsessão do momento. Afinal, a que momento me refiro? Pensava que sabias. Que te recordavas. Foi um momento único. Tão importante! Não quero acreditar que te esqueceste. Momentos como o nosso são inesquecíveis. Primeiro queres saber que momento foi esse. Muito bem. Não me zango, nem me exaspero. Vais lembrar-te de certeza. Pronto, vou revelar o que foi o momento. O nosso primeiro beijo. Essa tua amargura quer dizer saudade? É o que sinto também. Não quero acreditar no que ouvi. Não houve um primeiro beijo. Só enviaste nas cartas a gravação dos teus lábios pintados com um batom vermelho vivo. E assim a primeira carta enviada com o rubro dos teus lábios foi o primeiro beijo. Um beijo virtual, portanto. Mais frio que o frio que sinto.
O momento que pensava ter sido aquele momento esfumou-se e não tinha a ver com ela. Na verdade nunca a beijei. Nem podia ter acontecido. Era pura como as águas cristalinas de um regato que nunca foi poluído.
Mas houve um primeiro beijo e ela ficou fora desse cenário. Por mais que force a memória, não me lembro. Continuo a não me lembrar. Mesmo assim, não desisto. E agora tenho uma certeza. O momento aconteceu depois.
Não a culpo, por ter sido a mulher que me desviou o destino. O seu amor por mim era sincero. Devo respeitar o seu sofrimento.
Acordei a pensar que eras como um lago de águas cristalinas. Puras. Mas agora sinto-as geladas. Não sei o que está a acontecer. As águas do lago onde me banhava ainda estão na minha frente, mas já não me encorajam para me banhar nelas. Perdoa-me. Diz que me perdoas!
Que frio! Nunca imaginei que havia este frio.
Diz-me, olhos tristes, que estou a ver-te, que não é um sonho. Fica comigo esta noite. Amanhã. Sempre.
Não?
Tive muitas culpas por a nossa relação não ir em frente. Não fui fiel, bem sei. Mas estou inocente por o primeiro beijo não ter acontecido contigo. Digamos que não facilitaste. Como já disse, "eras pura como um lago de águas cristalinas onde os meus olhos se banhavam em cada momento que estava contigo". Bem tentei que o beijo acontecesse e tu sabes que não estou a mentir.
Mas quando foi que aconteceu o primeiro beijo?
Esta passagem da minha vida já foi contada, mas é importante para continuar a procurar quando foi que aconteceu o meu primeiro beijo.
Mas houve um primeiro beijo e ela ficou fora desse cenário. Por mais que force a memória, não me lembro. Continuo a não me lembrar. Mesmo assim, não desisto. E agora tenho uma certeza. O momento aconteceu depois.
Não a culpo, por ter sido a mulher que me desviou o destino. O seu amor por mim era sincero. Devo respeitar o seu sofrimento.
Acordei a pensar que eras como um lago de águas cristalinas. Puras. Mas agora sinto-as geladas. Não sei o que está a acontecer. As águas do lago onde me banhava ainda estão na minha frente, mas já não me encorajam para me banhar nelas. Perdoa-me. Diz que me perdoas!
Que frio! Nunca imaginei que havia este frio.
Diz-me, olhos tristes, que estou a ver-te, que não é um sonho. Fica comigo esta noite. Amanhã. Sempre.
Não?
Tive muitas culpas por a nossa relação não ir em frente. Não fui fiel, bem sei. Mas estou inocente por o primeiro beijo não ter acontecido contigo. Digamos que não facilitaste. Como já disse, "eras pura como um lago de águas cristalinas onde os meus olhos se banhavam em cada momento que estava contigo". Bem tentei que o beijo acontecesse e tu sabes que não estou a mentir.
Mas quando foi que aconteceu o primeiro beijo?
Esta passagem da minha vida já foi contada, mas é importante para continuar a procurar quando foi que aconteceu o meu primeiro beijo.
A vidente só começou a trabalhar depois do almoço. Recordo-me como se fosse ontem. A primeira pessoa a ser atendida foi a minha prima Lenita. Depois fui eu. Por acaso estávamos em volta de uma mesa de pé-de-galo de tampo circular. Só por acaso. Não sei se isso teve influência no modo como correu a sessão.
Ficámos frente a frente. Enquanto conversámos, não deixou de arrotar. Coisa de videntes. Umas arrotavam. Outros parecia que ficavam sonolentas. Ainda noutras parecia que as feições do rosto se modificavam.
A casa estava possuída pelos espíritos, pensei. Mas também podia ser encenação. Iria ficar muito atento. Tinham-me alertando para todos os truques, possíveis e impossíveis.
Mostrei-lhe várias fotografias de pessoas minhas conhecidas. Mortos misturados com vivos, para lhe lançar a confusão. A mulher usava óculos de ver ao perto, mas tinha-os em cima da mesa.
A certa altura olhou-me de olhos nos olhos e afirmou:
«Esta mulher desviou-lhe o destino!»
Era uma fotografia da Julieta, a principal suspeita do primeiro beijo.
Conheci-a no ano em que a Manuela resolveu passar o mês de setembro no Porto, o que me deixou desgostoso. Era o único mês do ano de que dispúnhamos para estarmos juntos num banco da Corredoura, passearmos pelas ruas, vermos filmes da inesquecível Sissi no café Alentejano. Portalegre sem a Manuela era como uma noite sem luar. Mesmo assim, não me movimentei para exercer qualquer represália. Passei a frequentar o café Central e aí conheci vários rapazes e passei a fazer parte do grupo deles. Um grupo enorme, diga-se. Passávamos as tardes a jogar o dominó, íamos ao mercado aos sábados de manhã e noutros dias jogávamos a bola num pátio enorme da Mocidade Portuguesa. À noite andávamos pela cidade atrás das raparigas. Coisas de importância insignificante. Então eram assim os meus dias amargurados de setembro. Não tinha a Manuela, já que outros ventos a levaram para longe.
Foi a meio do mês que a minha irmã me apresentou a Julieta e outras duas jovens cujos nomes estão escondidos nos escaninhos. da memória. Poucos dias depois reparei que as três estavam interessadas em mim e descansei por serem três e até achei divertido quando uma noite fomos ao "Cine Parque" e as três disputaram com um certo ardor o lugar à minha direita, já que a minha irmã estava à esquerda. Acabou por vencer a mais bonita das três. Precisamente a Julieta.
Entretanto o meu tio Carolino organizou aos fins de semana alguns piqueniques onde tive oportunidade de conviver com elas, dando especial atenção à Julieta. Mas nada aconteceu. Bem tentou. O meu coração era enorme mas continuava todo preenchido pela Manuela, apesar do receio que tinha de ela se apaixonar no Porto.
No ano seguinte voltei a Portalegre pelas férias e desta vez a Manuela não faltou ao encontro. Foi o ano em que me senti, até então, mais feliz na minha vida. Mas nada de beijos trocados. Só um reparo. O setembro passou com a velocidade um relâmpago.
Nesse ano entrei para a Faculdade de Ciências e cursei Ciências Geológicas.
Por força de uma coisa ruim chamada ciúme, quando já me tinha mudado da sinistra pensão da rua de São Bento, dos indianos e da Rosa Maria, para a travessa de São Sebastião.
Dois anos depois a perseverante Julieta entrou na minha vida com uma intensidade tal que esqueci-me totalmente de um compromisso assumido com a Manuela, após ela ter-me proposto que reatássemos em setembro. De março a setembro não escreveríamos uma única carta e depois logo se veria se nos entendíamos. Acho que foi um grande erro que ambos cometemos ao não continuarmos com as nossas cartas de cá para lá e de lá para cá. Afinal tinham sido as cartas o principal elo de união no passado.
Já em Portalegre, aconteceu o que aconteceu.
A protagonista do primeiro beijo, para mal dos meus pecados, foi a Julieta. Finalmente consegui lembrar-me.
A protagonista do primeiro beijo, para mal dos meus pecados, foi a Julieta. Finalmente consegui lembrar-me.
Era domingo e o tio Carolino organizou, como de costume, um piquenique, desta vez na Quinta Branca. Esses agradáveis piqueniques começavam pela manhã e prolongavam-se até à noite. E foi ao cair da noite que aconteceu o primeiro beijo. A certa altura conseguimos escapar-nos de todos e aconteceu o primeiro beijo.
Prolongado?
Curto?
Saboroso?
Um primeiro beijo não se esquece, penso eu. Mas esqueci-me. Lamento, Julieta. Porque fugimos de todos para uma zona menos iluminada, o momento do beijo deve ter sido inebriante.
Talvez te lembres. Eu não. Não te culpo. Gostavas muito de mim e fizeste tudo para me conquistar. O primeiro beijo que trocámos deve ter sido algo de especial porque afinal era o primeiro beijo. Pelo menos para ela foi sentido de forma especial. O mais que posso fazer para aliviar o seu desgosto é dizer que lamento muito por esse beijo se tornar amargo com o passar dos dias. Nunca pensei em vingança.
Prolongado?
Curto?
Saboroso?
Um primeiro beijo não se esquece, penso eu. Mas esqueci-me. Lamento, Julieta. Porque fugimos de todos para uma zona menos iluminada, o momento do beijo deve ter sido inebriante.
Talvez te lembres. Eu não. Não te culpo. Gostavas muito de mim e fizeste tudo para me conquistar. O primeiro beijo que trocámos deve ter sido algo de especial porque afinal era o primeiro beijo. Pelo menos para ela foi sentido de forma especial. O mais que posso fazer para aliviar o seu desgosto é dizer que lamento muito por esse beijo se tornar amargo com o passar dos dias. Nunca pensei em vingança.
Que sejas feliz, Simone, mulher do meu primeiro beijo!
«Por vezes ainda pensa em si.» Disse-me, um dia a vidente.
«Mas foi há muito tempo!»
«E o Mário...?»
«Às vezes.»
«Por vezes ainda pensa em si.» Disse-me, um dia a vidente.
«Mas foi há muito tempo!»
«E o Mário...?»
«Às vezes.»
«Não lhe queira mal.»
«Bem tento.»
«Não pensa todos os dias naquele amor que perdeu?»
Uma coincidência curiosa. A vidente pôs-se, de seguida, a descrever uma casa que tinha uma cercadura de arbustos e mais coisas que esqueci, talvez por desinteresse. Por certo a mulher estava a improvisar. Ia jurar que nunca tinha visto tal casa. Bem me disseram para ficar atento aos truques.
«Não conheço essa casa...» Desvalorizei.
Indiferente, continuou a descrever a casa. Até que a Olinda exclamou, com convicção:
«É a casa de campo da Julieta!»
Ela foi apenas fumo de verão. Apareceu e desapareceu meteoricamente na minha vida. Disse-me o tio Carolino que ela teve um grande choque quando decidi acabar o namoro. Estávamos em novembro de 1962 e o namoro tinha começado em meados de agosto. Esse namoro foi só um obstáculo para me afastar da Manuela.
«Não pensa todos os dias naquele amor que perdeu?»
Uma coincidência curiosa. A vidente pôs-se, de seguida, a descrever uma casa que tinha uma cercadura de arbustos e mais coisas que esqueci, talvez por desinteresse. Por certo a mulher estava a improvisar. Ia jurar que nunca tinha visto tal casa. Bem me disseram para ficar atento aos truques.
«Não conheço essa casa...» Desvalorizei.
Indiferente, continuou a descrever a casa. Até que a Olinda exclamou, com convicção:
«É a casa de campo da Julieta!»
Ela foi apenas fumo de verão. Apareceu e desapareceu meteoricamente na minha vida. Disse-me o tio Carolino que ela teve um grande choque quando decidi acabar o namoro. Estávamos em novembro de 1962 e o namoro tinha começado em meados de agosto. Esse namoro foi só um obstáculo para me afastar da Manuela.
A vidente falou de uma rapariga (não disse mulher) loura que gostava muito de mim e que desviou o meu destino. Acabava de meter o dedo na ferida.
O tema esgotou-se rapidamente. Era então altura de mostrar uma fotografia da Manuela. Parece que leu o meu pensamento. Sem qualquer hesitação, afirmou:
«Essa, sim... essa fazia-o feliz...»
Fiquei abismado. Os óculos continuavam sobre a mesa. Não havia hipótese de fraude. E mesmo que visse bem ao perto sem óculos, certamente que não conheceu a Manuela. O caso começava a tornar-se sério e tinha que rever o ceticismo com que encarei aquela reunião. A mulher estava a acertar em cheio em tudo. Era mesmo uma bruxa daquelas a sério!
Para uma outra médium que considerei de nível mais baixo, não presente nesse dia, a Manuela era responsável por a minha vida ter estado em letargia durante mais de trinta anos. Afirmou que nem sequer tinha coragem de aparecer. Era um espírito mau. Mesmo muito mau. Definitivamente. Sentia raiva porque não me teve em vida. Ouvia-a chorar com raiva de não me ter. Para ela havia outra pessoa que tinha muita energia e protegia-me e queria que fosse para a frente.
Em que ficávamos?
Pergunta que não fiz à vidente. Era certo que ela tinha posto o preto no branco. Por causa da Julieta perdi a Manuela para sempre. Pelo menos neste universo, onde, dizem, estamos todos de passagem. Mas ela não acredita em universos paralelos. É pena porque, num desses universos ou mais que um, a minha relação com a mulher única, que era tão "pura como um lago de águas cristalinas onde os meus olhos se banhavam...", continuou com toda a força do mundo e sem interferências. Foi tão intenso o amor que continuámos a ter um pelo outro, e sem necessidade de acontecer o milagre de setembro, que ao primeiro beijo que trocámos quando os nossos lábios se uniram, se seguiram muitos outros e continuam hoje a ser uma realidade.
«Essa, sim... essa fazia-o feliz...»
Fiquei abismado. Os óculos continuavam sobre a mesa. Não havia hipótese de fraude. E mesmo que visse bem ao perto sem óculos, certamente que não conheceu a Manuela. O caso começava a tornar-se sério e tinha que rever o ceticismo com que encarei aquela reunião. A mulher estava a acertar em cheio em tudo. Era mesmo uma bruxa daquelas a sério!
Para uma outra médium que considerei de nível mais baixo, não presente nesse dia, a Manuela era responsável por a minha vida ter estado em letargia durante mais de trinta anos. Afirmou que nem sequer tinha coragem de aparecer. Era um espírito mau. Mesmo muito mau. Definitivamente. Sentia raiva porque não me teve em vida. Ouvia-a chorar com raiva de não me ter. Para ela havia outra pessoa que tinha muita energia e protegia-me e queria que fosse para a frente.
Em que ficávamos?
Pergunta que não fiz à vidente. Era certo que ela tinha posto o preto no branco. Por causa da Julieta perdi a Manuela para sempre. Pelo menos neste universo, onde, dizem, estamos todos de passagem. Mas ela não acredita em universos paralelos. É pena porque, num desses universos ou mais que um, a minha relação com a mulher única, que era tão "pura como um lago de águas cristalinas onde os meus olhos se banhavam...", continuou com toda a força do mundo e sem interferências. Foi tão intenso o amor que continuámos a ter um pelo outro, e sem necessidade de acontecer o milagre de setembro, que ao primeiro beijo que trocámos quando os nossos lábios se uniram, se seguiram muitos outros e continuam hoje a ser uma realidade.
Que frio!, que solidão!
Quero acreditar que sim. Que está a acontecer o momento do beijo num outro universo paralelo.
Quero acreditar que sim. Que está a acontecer o momento do beijo num outro universo paralelo.
Mas continuo sem saber como foi o primeiro beijo...

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