Vale a pena recordar...
O Vítor estava a fazer-lhe sinais. Aproximou-se.
«Vou largar a máquina. Tenho que ir trabalhar.»
Afinal era só um convite.
«Obrigado. Como está ela hoje?»
«Ruim. Tenho jogado baixo. Precisa de uma chicotada psicológica que o meu amigo bem pode dar.»
Todo o cuidado era pouco quando as máquinas vinham das mãos do Vítor. Na verdade ele jogava muito baixo e as máquinas "viciavam-se nesse modo de jogar".
«Em princípio não vou passar dos vinte e cinco créditos.»
«Boa sorte, meu amigo. Pode ser que consiga dar-lhe a volta.»
Introduziu na ranhura uma nota de dez euros e fixou os vinte e cinco créditos como jogada. Reparou que à sua direita, um desconhecido jogava a duzentos e cinquenta créditos, o que equivalia a dizer que cada toque na tecla de reapostar custava cinco euros. Iria com frequência ao cofre e Mário não. Teoricamente, pois enganou-se. Parecia que a máquina do homem que jogava forte estava bloqueada.
O Vítor estava a fazer-lhe sinais. Aproximou-se.
«Vou largar a máquina. Tenho que ir trabalhar.»
Afinal era só um convite.
«Obrigado. Como está ela hoje?»
«Ruim. Tenho jogado baixo. Precisa de uma chicotada psicológica que o meu amigo bem pode dar.»
Todo o cuidado era pouco quando as máquinas vinham das mãos do Vítor. Na verdade ele jogava muito baixo e as máquinas "viciavam-se nesse modo de jogar".
«Em princípio não vou passar dos vinte e cinco créditos.»
«Boa sorte, meu amigo. Pode ser que consiga dar-lhe a volta.»
Introduziu na ranhura uma nota de dez euros e fixou os vinte e cinco créditos como jogada. Reparou que à sua direita, um desconhecido jogava a duzentos e cinquenta créditos, o que equivalia a dizer que cada toque na tecla de reapostar custava cinco euros. Iria com frequência ao cofre e Mário não. Teoricamente, pois enganou-se. Parecia que a máquina do homem que jogava forte estava bloqueada.
Concentrou-se no jogo. O Vítor tinha razão. A máquina estava ruim. Engoliu num ápice os dez euros.
«Tenho que jogar mais pausadamente.» Pensou.
«Isto é escandaloso!»
Virou-se para o desconhecido.
«Já reparei que o senhor só conseguiu ir uma vez ao cofre e tirou cobre.»
O nível mais baixo do bónus que começava em vinte euros.
«Não compreendo.»
«Mas eu compreendo. Se lhe contasse metade do que sei, compreendia logo.»
O homem suspendeu o jogo.
«Ah sim?» admirou-se. «Não me diga que há trapaça! Olhe que já lá vão mais de oitocentos euros e a máquina não tem dado nada.»
«Pode crer que ela bloqueou. Ou melhor, está numa série ruim. Nem sequer consegue ir ao cofre, o que é uma anomalia das grandes. Noutros tempos estas séries eram mais curtas.»
«Cofre?»
«É como chamamos vulgarmente ao bónus progressivo. Mas vai começar a abrir com mais frequência mais logo, acredite. É só uma questão de tempo.»
O homem suspirou de alívio.
«Deus o oiça, porque já estou quase a desistir.»
«Deus, não. O diabo. Deus não joga aos dados. Ou melhor: não devia jogar.»
Insinuação perigosa para quem já sofrera na pele as influências do deus menor. Mas Mário não tinha emenda. Não tolerava injustiças, viessem elas donde viessem.
Ficaram em silêncio, cada um entregue ao seu jogo. Pouco depois, conforme Mário previra, o desconhecido foi ao cofre. Mas a sorte não estava do seu lado. Morreu logo na praia. Um cinco e um vinte nos quadrados. Não conseguiu atingir os mínimos para continuar no bónus.
«A partir de agora terá oportunidade de ir mais vezes ao prémio progressivo. Mas não se entusiasme. Está numa série ruim e sabe-se lá quando esta acaba. A realidade nua e crua é que as máquinas estão mais que manipuladas. Eles dão bons prémios a quem querem. A uns poucos e privilegiados. Os sortudos do costume. Sabe?...»
«Sim?»
«Observo mais do que jogo e tenho assistido a coisas do arco da velha. Por exemplo, aquela senhora que está à nossa esquerda a jogar nos cavalos e a apostar a cinco e a sete créditos, vá lá nove, como de costume não está a dar-se mal. Por norma vai ao cofre três, quatro vezes em cada noite que vem jogar. E olhe que já a vi ir ao ouro e há quem diga que atingiu mais que uma vez o prémio máximo que é a platina.»
«Isso não está certo.»
«Acredite, meu amigo. No Fort Knox, e não só, passam-se coisas estranhas. Tudo é possível acontecer. E depois há o tal princípio da Física que, na prática, se traduz numa reação à ação. Uma noite, um indivíduo, num ato de fúria, deu cabo dos monitores de três máquinas de vinte cêntimos. Suponho que o fez com uma cadeira. Antes ouvi-o ameaçar que dava cabo das máquinas porque estas não davam prémios. Cumpriu a promessa.»
«E depois, que lhe aconteceu?»
«De repente apareceram os seguranças. O resto não sei, mas imagino.»
«Deve ter sido entregue à polícia.»
«É o que penso também.»
«Já lá vão quase mil euros e é o que vê. Vou desistir antes que me passe também pela cabeça uma coisa má.»
«Se a máquina não está a dar é o melhor que tem a fazer, meu amigo.»
«Tal e qual. Por outro lado...» Fez um compasso de espera. «Olhe, desisto.»
«E eu também vou abandonar a máquina.»
O desconhecido jogou os últimos créditos e virou-se para o Mário.
«Convido-o para bebermos uma imperial no piso de cima. Lá o ambiente é mais calmo. Vejo que está bem informado. Creio que não se importa de contar-me alguns casos anómalos que se passam aqui.»
«Com todo o gosto. E agradeço o convite.»
«Tenho que jogar mais pausadamente.» Pensou.
«Isto é escandaloso!»
Virou-se para o desconhecido.
«Já reparei que o senhor só conseguiu ir uma vez ao cofre e tirou cobre.»
O nível mais baixo do bónus que começava em vinte euros.
«Não compreendo.»
«Mas eu compreendo. Se lhe contasse metade do que sei, compreendia logo.»
O homem suspendeu o jogo.
«Ah sim?» admirou-se. «Não me diga que há trapaça! Olhe que já lá vão mais de oitocentos euros e a máquina não tem dado nada.»
«Pode crer que ela bloqueou. Ou melhor, está numa série ruim. Nem sequer consegue ir ao cofre, o que é uma anomalia das grandes. Noutros tempos estas séries eram mais curtas.»
«Cofre?»
«É como chamamos vulgarmente ao bónus progressivo. Mas vai começar a abrir com mais frequência mais logo, acredite. É só uma questão de tempo.»
O homem suspirou de alívio.
«Deus o oiça, porque já estou quase a desistir.»
«Deus, não. O diabo. Deus não joga aos dados. Ou melhor: não devia jogar.»
Insinuação perigosa para quem já sofrera na pele as influências do deus menor. Mas Mário não tinha emenda. Não tolerava injustiças, viessem elas donde viessem.
Ficaram em silêncio, cada um entregue ao seu jogo. Pouco depois, conforme Mário previra, o desconhecido foi ao cofre. Mas a sorte não estava do seu lado. Morreu logo na praia. Um cinco e um vinte nos quadrados. Não conseguiu atingir os mínimos para continuar no bónus.
«A partir de agora terá oportunidade de ir mais vezes ao prémio progressivo. Mas não se entusiasme. Está numa série ruim e sabe-se lá quando esta acaba. A realidade nua e crua é que as máquinas estão mais que manipuladas. Eles dão bons prémios a quem querem. A uns poucos e privilegiados. Os sortudos do costume. Sabe?...»
«Sim?»
«Observo mais do que jogo e tenho assistido a coisas do arco da velha. Por exemplo, aquela senhora que está à nossa esquerda a jogar nos cavalos e a apostar a cinco e a sete créditos, vá lá nove, como de costume não está a dar-se mal. Por norma vai ao cofre três, quatro vezes em cada noite que vem jogar. E olhe que já a vi ir ao ouro e há quem diga que atingiu mais que uma vez o prémio máximo que é a platina.»
«Isso não está certo.»
«Acredite, meu amigo. No Fort Knox, e não só, passam-se coisas estranhas. Tudo é possível acontecer. E depois há o tal princípio da Física que, na prática, se traduz numa reação à ação. Uma noite, um indivíduo, num ato de fúria, deu cabo dos monitores de três máquinas de vinte cêntimos. Suponho que o fez com uma cadeira. Antes ouvi-o ameaçar que dava cabo das máquinas porque estas não davam prémios. Cumpriu a promessa.»
«E depois, que lhe aconteceu?»
«De repente apareceram os seguranças. O resto não sei, mas imagino.»
«Deve ter sido entregue à polícia.»
«É o que penso também.»
«Já lá vão quase mil euros e é o que vê. Vou desistir antes que me passe também pela cabeça uma coisa má.»
«Se a máquina não está a dar é o melhor que tem a fazer, meu amigo.»
«Tal e qual. Por outro lado...» Fez um compasso de espera. «Olhe, desisto.»
«E eu também vou abandonar a máquina.»
O desconhecido jogou os últimos créditos e virou-se para o Mário.
«Convido-o para bebermos uma imperial no piso de cima. Lá o ambiente é mais calmo. Vejo que está bem informado. Creio que não se importa de contar-me alguns casos anómalos que se passam aqui.»
«Com todo o gosto. E agradeço o convite.»
«Então, vamos.»
«Aqui nada acontece por acaso. Por exemplo, empregados que estão a comunicar com uma suposta central em primeira mão a saída de um prémio chorudo ainda antes desse prémio estar visível. Já assisti a um caso desses. Nem mais nem menos uma platina que vale sempre mais de dois mil euros. O fiscal estava atrás da máquina a comunicar a ida à platina antes de ela sair. Houve mais pessoas que assistiram.»
«Curioso.»
«Curioso, não. Escandaloso.»
«Já se queixou na inspeção?»
«Mais do que uma vez. Mas não vale a pena. Estão feitos uns com os outros. Quer ouvir um caso a que assisti há dias?»
«Aqui nada acontece por acaso. Por exemplo, empregados que estão a comunicar com uma suposta central em primeira mão a saída de um prémio chorudo ainda antes desse prémio estar visível. Já assisti a um caso desses. Nem mais nem menos uma platina que vale sempre mais de dois mil euros. O fiscal estava atrás da máquina a comunicar a ida à platina antes de ela sair. Houve mais pessoas que assistiram.»
«Curioso.»
«Curioso, não. Escandaloso.»
«Já se queixou na inspeção?»
«Mais do que uma vez. Mas não vale a pena. Estão feitos uns com os outros. Quer ouvir um caso a que assisti há dias?»
Continuando, como de costume o jogo não corria de feição. Só esperava que lhe saísse uma linha boa, já que o bónus nunca pagava como devia. Se não saísse, paciência.
Foi então que reparou num homem que jogava com um certo vigor no tal jogo egípcio. De duas maneiras. Com um batimento forte na tecla de reapostar e apostando "9x10", a vinte cêntimos cada linha, o que significava, em metal sonante, dezoito euros por cada batimento. Reconheceu-o como sendo um dos duros habituais dos "dinheiros", bem como o companheiro que estava sentado à esquerda, na outra máquina. Este via-o sempre nos dias em que frequentava o casino. Ele e a sua bengala metálica. Uma amiga dizia que ele devia dormir lá. Em boa verdade tinha razão. Sentava-se numa das cadeiras frente às máquinas da Star Wars e aí adormecia. De boca muito aberta, olhos fechados, parecia dormir profundamente. O soporífero era, nem mais nem menos, uma das televisões instaladas no alto. O velho raramente jogava.
O homem estava a jogar muito forte e parece que a máquina não queria colaborar.» Pensou.
Pior para ele e melhor para quem jogasse a seguir na máquina.
A resposta não se fez esperar. Em pouco tempo estava sem dinheiro. Levantou-se e dirigiu-se ao balcão para levantar dinheiro no terminal de multibanco. Pouco depois voltava ao jogo, sempre apostando de cada vez os dezoito euros da ordem. Levantou-se mais que uma vez para ir ao balcão.
Alguma coisa alterou-se. O jogador passou um nota de cinquenta para as mãos do velho da bengala metálica e disse-lhe qualquer coisa que Mário traduziu como:
«Joga nessa máquina, Chico.»
E o velho começou a jogar. Fraco. Qual era a intenção?
Minutos depois teve a resposta.
O velho da bengala parou o jogo e disse qualquer coisa ao companheiro, que também suspendeu os batimentos ritmados e fortes. Passava na altura um mecânico. Bastou um levantar de braço do velho para este se dirigir a eles. Havia qualquer anomalia com a máquina.
O mecânico ouviu-os com atenção. Como resposta, encolheu os ombros e abriu a máquina do velho. De seguida, retirou a caixa preta e levou-a consigo. Voltou pouco depois e repetiu a operação em outras duas máquinas, agora do lado oposto, ficando operacional a diametralmente oposta à máquina onde o jogador continuou a jogar.
Não queria acreditar no que viam os meus olhos. Uma cena surrealista! Aquilo não podia estar a acontecer. Mas o curioso é que o homem voltou a levantar-se para ir buscar mais dinheiro.
Mesmo assim não resultava?
As três máquinas ficaram desligadas durante perto de vinte minutos. A do Mário também estava, mas de outra maneira. Tinha deixado de jogar e ficara mais que atento à “jogada” que se passava na sua frente.
Mais uma vez o jogador levantou-se, mas não se dirigiu ao balcão. Encaminhou-se para os lados da Star Wars. Ato contínuo, o velho pendurou a bengala na parte saliente da máquina. Era um sinal que o jogador ia voltar. Entretanto o tempo corria. E se perguntasse ao velho se ele voltava? Uma má ideia. Uma péssima ideia. Tinha que esperar que a bengala fosse retirada.
«Que se passa contigo?»
Era a sua amiga.
«Já te conto...»
«Nunca mais apareceste no Forte...»
«Pois não. Já tinhas saudades minhas? Não creio.»
«Fazes as perguntas e dás as respostas. Só falta apanhares as canas dos foguetes.»
«Rita...»
Viu logo que tinha metido água.
«Vou dar mais uma volta.»
«Vai, vai...»
E foi. A bengala já não estava a guardar a máquina. Era uma oportunidade para tentar a sua sorte. Ou má sorte porque o resultado foi negativo.
Voltou pouco depois. O jogador tinha mesmo desistido?
Espreitou para o outro lado do bloco. Bingo! Lá estavam os dois. Levantou-se e passou para o outro lado. Mesmo a tempo. O jogador tinha finalmente entrado no bónus. Jogando com um fator multiplicativo dez, e em virtude do facto de jogar o bónus ter à partida o fator multiplicativo três, isso significava que cada aposta com prémio multiplicava automaticamente por trinta. Isto já para não falar do mais importante. Após premir-se uma tecla para se iniciar o bónus, um livro abria-se e nas suas páginas folheadas eram mostradas todas as figuras presentes no jogo. Fixada uma, tudo dependia da frequência com que essa imagem surgia em cada jogada de bónus. Quantas mais, melhor. Cinco correspondia ao máximo de colunas e a um prémio substancialmente bom.
À distância seguiu o evoluir do jogo. O bónus repetiu-se e, num ápice, o jogador recuperou mais tudo quanto tinha perdido antes na outra máquina.
«Agora parece que já sei porque o mecânico retirou as três caixas» pensou. «O insucesso na primeira máquina funcionou como uma espécie de sinal. Estava destinada a ser a máquina perdedora. Retirando de cena três máquinas, só restava uma livre. Seria a máquina que passaria a estar "aberta". Pronta a dar bom jogo. »
Agora o jogador tinha à disposição só duas máquinas. A primeira, onde o velho jogou baixo e não teve êxito e a outra, do lado diametralmente oposto. Mas o Mário não assistiu ao desfecho evidente. Preferiu deambular entre as slots, com ganhos aqui e percas ali, sujeito ao seu próprio determinismo daquela noite. Com métodos daquele cariz muita gente perderia em virtude da quota destinada aos prémios. Quando voltou ao "local do crime" já o homem estava na máquina "certa", no bónus que estava numa de repetir. rapidamente recuperou o prejuízo e certamente ia ganhar a partir de aí.
Quantas vezes já tinha acontecido aquele truque das caixas negras?
O interlocutor de Mário levantou o copo vazio de cerveja no momento em que o empregado do bar olhava na direção deles. Pouco depois tinham mais duas "loiras" fresquinhas na sua frente.
«Muito me conta, meu amigo» disse. «É gravíssima essa história das três caixas retiradas. Mas que poderes tem o homem da bengala que as mandou retirar?»
«Não sei. Talvez o outro tivesse alguma influência nos meandros obscuros do casino.»
«Quanto ao caso da senhora que joga fraco e vai ao cofre com frequência também tem que se lhe diga. Mas o homem da bengala...»
«Eu explico. O homem da bengala não é um jogador na aceção da palavra. Até troca uma assistência a um utente seu amigo que joga forte no jogo dos dinheiros por um desafio de futebol na Sport TV.»
Esperou que o homem que tinha conhecido recentemente bebesse o resto do copo meio de cerveja contido no copo.
«É curioso.»
«Muito mais curioso se lhe disser que esse indivíduo não falha um dia no casino. Como joga pouco, afinal o que está ali a fazer?»
O homem abriu os braços, talvez como Arquimedes de Siracusa o fez quando da descoberta que o tornou célebre para a posteridade.
«O velho empresta dinheiro?»
«Não me parece. A propósito de um esclarecimento que dei a uma inspetora sobre a existência dos vampiros que deslizavam entre as máquinas, ora num piso, ora noutro, não sabendo muito bem qual o seu papel, esta desvalorizou a informação. Contudo, confessou-me que havia usurários no casino que emprestavam dinheiro a juros muito altos.»
«Eu sei. Juros ao dia.»
«Eu sei. Juros ao dia.»
Ele sabia?
«Daí a presença dele junto ao tal jogador que apostava forte na máquina dos vinte cêntimos?»
Acabou de beber a cerveja que restava no copo. Era sempre a parte mais desagradável pois perdera grande parte do gás.
«Vamos a outra?» perguntou o seu interlocutor. «Mas antes disso...»
«Sim?, diga.»
«Ainda não nos apresentámos. Nestas condições em que nos conhecemos, um nome não é nada mas faz parte do protocolo. Já se apercebeu certamente que neste momento somos apenas dois desconhecidos. Hoje estamos aqui a falar e podemos nunca mais nos encontrar no futuro. De qualquer das formas, chamo-me Anaclides. Agora vou confessar uma coisa. Sou jornalista e trabalho para um jornal da nossa praça.»
«Daí a presença dele junto ao tal jogador que apostava forte na máquina dos vinte cêntimos?»
Acabou de beber a cerveja que restava no copo. Era sempre a parte mais desagradável pois perdera grande parte do gás.
«Vamos a outra?» perguntou o seu interlocutor. «Mas antes disso...»
«Sim?, diga.»
«Ainda não nos apresentámos. Nestas condições em que nos conhecemos, um nome não é nada mas faz parte do protocolo. Já se apercebeu certamente que neste momento somos apenas dois desconhecidos. Hoje estamos aqui a falar e podemos nunca mais nos encontrar no futuro. De qualquer das formas, chamo-me Anaclides. Agora vou confessar uma coisa. Sou jornalista e trabalho para um jornal da nossa praça.»
«Não me diga que...? Isso seria ouro sobre azul. Eu chamo-me Mário.»
«Já sabia.»
«O seu nome é fora do vulgar. Curiosamente já conheci uma pessoa que se chamava Anaclides (1).»
O outro sorriu.
«Desculpe, na verdade não me chamo Anaclides. Inspirei-me numa das personagens da sua história. No nosso caso, um nome vale o que vale. E esse Anaclides afinal nunca existiu. Ou existiu?»
Mário franziu o sobrolho, intrigado.
«Este homem sabe demais!» pensou. «Cada um no seu campo. Quanto ao meu, já o conheço de olhos fechados e começo a aprender como devo movimentar-me sem ser apanhado de surpresa por areias movediças...»
Apontou um dedo ao seu interlocutor.
«Como me descobriu?»
O homem não conseguiu evitar um sorriso irónico.
«A net é um mundo em expansão a tender quase para infinito em termos de recolha de informação. Nada se perde. E para se descobrir o que se pretende basta ter uma chave.»
«Tem razão, senhor Anaclides. Posso tratá-lo assim?»
«Claro. Não tem outro nome disponível.»
«Percebo. Será que anda a investigar?»
«O seu nome é fora do vulgar. Curiosamente já conheci uma pessoa que se chamava Anaclides (1).»
O outro sorriu.
«Desculpe, na verdade não me chamo Anaclides. Inspirei-me numa das personagens da sua história. No nosso caso, um nome vale o que vale. E esse Anaclides afinal nunca existiu. Ou existiu?»
Mário franziu o sobrolho, intrigado.
«Este homem sabe demais!» pensou. «Cada um no seu campo. Quanto ao meu, já o conheço de olhos fechados e começo a aprender como devo movimentar-me sem ser apanhado de surpresa por areias movediças...»
Apontou um dedo ao seu interlocutor.
«Como me descobriu?»
O homem não conseguiu evitar um sorriso irónico.
«A net é um mundo em expansão a tender quase para infinito em termos de recolha de informação. Nada se perde. E para se descobrir o que se pretende basta ter uma chave.»
«Tem razão, senhor Anaclides. Posso tratá-lo assim?»
«Claro. Não tem outro nome disponível.»
«Percebo. Será que anda a investigar?»
Demorou a responder.
«Não lhe posso dizer. Mas vai ter notícias minhas.»
As imperiais já estavam sobre a mesa. Mário pegou num dos copos e sentiu a mão arrefecer de imediato. Depois, levou o copo à boca e bebeu uma pequena porção de cerveja.
«Assim é que gosto dela» deu uma pancada ligeira com o fundo do copo sobre o tampo. «Borbulhante e fresca. Muito fresca.»
As imperiais já estavam sobre a mesa. Mário pegou num dos copos e sentiu a mão arrefecer de imediato. Depois, levou o copo à boca e bebeu uma pequena porção de cerveja.
«Assim é que gosto dela» deu uma pancada ligeira com o fundo do copo sobre o tampo. «Borbulhante e fresca. Muito fresca.»
O suposto Anaclides não comentou a dica de Mário sobre a imperial.
«Mas... e o outro?, e o Ildefonso?»
«O Mário nunca teria existido se o Ildefonso não fosse vivo.»
«Desconfio de uma coisa.»
«Então, de quê?»
Foi a vez do Anaclides pegar no copo de cerveja e imitar o Mário.
«Acho que há uma terceira pessoa.»
Mário inquietou-se.
«Mas... e o outro?, e o Ildefonso?»
«O Mário nunca teria existido se o Ildefonso não fosse vivo.»
«Desconfio de uma coisa.»
«Então, de quê?»
Foi a vez do Anaclides pegar no copo de cerveja e imitar o Mário.
«Acho que há uma terceira pessoa.»
Mário inquietou-se.
«O meu amigo acha e eu não acho. Mas anda a investigar alguma coisa?»
«Foi difícil ocupar uma máquina ao lado da sua Cleopatra. Sua, salvo seja. Pois tem razão, é muito simples. Nós estamos interessados na sua experiência, melhor dizendo, em tudo e todas as pessoas que conhece e que estão relacionados com este casino. Até no mais insignificante pormenor que, à partida, queira pôr de parte.»
«Nós?, disse "nós"? A pessoa com quem trabalha também vem cá?»
O homem que não se chamava Anaclides abriu os braços e acabou por deixar uma mão sobre o ombro de Mário.
«Meu amigo. Não lhe vou falar de "nós" nem dos objetivos a que nos propomos. Neste caso há que haver a máxima discrição para a nossa investigação ter êxito.»
«Foi difícil ocupar uma máquina ao lado da sua Cleopatra. Sua, salvo seja. Pois tem razão, é muito simples. Nós estamos interessados na sua experiência, melhor dizendo, em tudo e todas as pessoas que conhece e que estão relacionados com este casino. Até no mais insignificante pormenor que, à partida, queira pôr de parte.»
«Nós?, disse "nós"? A pessoa com quem trabalha também vem cá?»
O homem que não se chamava Anaclides abriu os braços e acabou por deixar uma mão sobre o ombro de Mário.
«Meu amigo. Não lhe vou falar de "nós" nem dos objetivos a que nos propomos. Neste caso há que haver a máxima discrição para a nossa investigação ter êxito.»
Mário agitou-se.
«Quem me dera!»
«Só uma pergunta. Está disposto a testemunhar quando chegar a altura?»
«Se for para o bem de todos utentes...»
«Se for para o bem de todos utentes...»
«Claro que é. No momento oportuno volto a contactar consigo.»
«E eu fico a aguardar com ansiedade.»
«Entretanto vou passando por aqui.»
A Mariana também disse as mesmas palavras. Não voltou a vê-la.
«Continue a ir à inspeção só para os enervar. E não quero só apanhar o peixe miúdo.»
«Há tubarões metidos no sistema?»
«Se os há! Temos que ser pacientes.»
Já estava a ficar desiludido. Agora ganhava mais alento.
«E é uma pena acontecer o que supostamente vai acontecer. Apesar de tudo, gosto de jogar no Fort Knox.»
«Sim. As máquinas são espetaculares.»
«Principalmente naquela parte em que se vai ao cofre.»
«Na entrada na prata...»
«E...»
«Mário!»
Virou-se, ficando de costas para o desconhecido. Era a sua amiga.
«Rita, podes esperar só um momento?»
«Porque foi que não me convidaste para beber uma imperial?»
«Bem» hesitou, mas encontrou logo uma saída. «Porque tu não bebes cerveja.»
«Desculpa tola.»
«Olha, deixa-me que te apresente um amigo que conheci lá em baixo quando jogava numa máquina das Cleopatras. O senhor Anaclides...»
«Não gozes comigo. O homem que estava contigo levantou-se logo mal me aproximei da vossa mesa.»
«E é uma pena acontecer o que supostamente vai acontecer. Apesar de tudo, gosto de jogar no Fort Knox.»
«Sim. As máquinas são espetaculares.»
«Principalmente naquela parte em que se vai ao cofre.»
«Na entrada na prata...»
«E...»
«Mário!»
Virou-se, ficando de costas para o desconhecido. Era a sua amiga.
«Rita, podes esperar só um momento?»
«Porque foi que não me convidaste para beber uma imperial?»
«Bem» hesitou, mas encontrou logo uma saída. «Porque tu não bebes cerveja.»
«Desculpa tola.»
«Olha, deixa-me que te apresente um amigo que conheci lá em baixo quando jogava numa máquina das Cleopatras. O senhor Anaclides...»
«Não gozes comigo. O homem que estava contigo levantou-se logo mal me aproximei da vossa mesa.»
Mário virou-se. Ela tinha razão.
«Quem era esse homem?»
«Apenas um indivíduo que conheci no Fort Knox. Convidou-me para beber um copo.»
«E de que falaram?»
«De coisas sem importância.»

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