Segundo a opinião do Mário, os quatro jovens tinham ocupado a máquina errada. Uma máquina com um software muito sofisticado, de tal forma que em pouco tempo se adaptava no momento certo ao modo de jogar do utente. Normalmente estendia um tapete com uma mescla de cores agradáveis à vista, o que significava que começava a oferecer prémios razoáveis. Fixada a vítima ao engodo, sugava-a até à medula.
Já sentira na pele, numa mão cheia de dias, várias evoluções traiçoeiras da Cleopatra 1, nada aleatórias, mas acentuadamente manipuladas pelos programadores (e alteradas remotamente) e com graus de liberdade para mudarem de série no momento ideal. Ao mesmo tempo, era mais que certo haver no casino corrupção. E da grossa. Mas provar era difícil. Senão, impossível. Daí ele ter desistido de fazer guerra aberta à inspeção e, por ricochete, expor os homens que mandavam verdadeiramente no evoluir do jogo. A ver quem? O silêncio era aconselhável. Quanto à sua participação nos jogos, as coisas foram de mal a pior e teve que abrandar o ímpeto no que dizia respeito às incursões no mundo das máquinas, melhor dizendo no mundo sinistro do software malicioso que geria o jogo dentro das normas pretendidas. Enfim, um mundo que era preciso abandonar a todo o custo, ou tentar que fosse cada vez menos frequentado. E assim fez. O abrandamento acabou por ser benéfico, pois permitiu que se debruçasse mais pelo "trabalho" que lhe fora encomendado. Assim, viu o mundo abrir-se para novas descobertas no micromundo que era o Fort Knox, um das galinhas dos ovos de ouro do casino, descobertas essas que o puseram atónito. Novos contactos fizeram-no navegar em meandros muito apertados, mas já com a foz à vista. Era só uma questão de tempo para a podridão cair de podre.
«O silêncio é a alma do negócio» pensou. «Tenho que ter paciência. Lá chegará o tempo em que este jogo manipulado será posto a nu.»
Premonição?
Não sabia. Mas tudo levava a crer que não estava muito longe de encontrar a verdade.
Aproximou-se mais dos jovens utentes...
«Apostamos quanto?» perguntou ao grupo o suposto chefe com o cabelo em crista longitudinal.
O mais calado de todos, que não era o mestiço nem o ruivo, propôs, algo receoso:
«Acho que devemos jogar a cinquenta, Tiago.»
Já sentira na pele, numa mão cheia de dias, várias evoluções traiçoeiras da Cleopatra 1, nada aleatórias, mas acentuadamente manipuladas pelos programadores (e alteradas remotamente) e com graus de liberdade para mudarem de série no momento ideal. Ao mesmo tempo, era mais que certo haver no casino corrupção. E da grossa. Mas provar era difícil. Senão, impossível. Daí ele ter desistido de fazer guerra aberta à inspeção e, por ricochete, expor os homens que mandavam verdadeiramente no evoluir do jogo. A ver quem? O silêncio era aconselhável. Quanto à sua participação nos jogos, as coisas foram de mal a pior e teve que abrandar o ímpeto no que dizia respeito às incursões no mundo das máquinas, melhor dizendo no mundo sinistro do software malicioso que geria o jogo dentro das normas pretendidas. Enfim, um mundo que era preciso abandonar a todo o custo, ou tentar que fosse cada vez menos frequentado. E assim fez. O abrandamento acabou por ser benéfico, pois permitiu que se debruçasse mais pelo "trabalho" que lhe fora encomendado. Assim, viu o mundo abrir-se para novas descobertas no micromundo que era o Fort Knox, um das galinhas dos ovos de ouro do casino, descobertas essas que o puseram atónito. Novos contactos fizeram-no navegar em meandros muito apertados, mas já com a foz à vista. Era só uma questão de tempo para a podridão cair de podre.
«O silêncio é a alma do negócio» pensou. «Tenho que ter paciência. Lá chegará o tempo em que este jogo manipulado será posto a nu.»
Premonição?
Não sabia. Mas tudo levava a crer que não estava muito longe de encontrar a verdade.
Aproximou-se mais dos jovens utentes...
«Apostamos quanto?» perguntou ao grupo o suposto chefe com o cabelo em crista longitudinal.
O mais calado de todos, que não era o mestiço nem o ruivo, propôs, algo receoso:
«Acho que devemos jogar a cinquenta, Tiago.»
O que não era mestiço nem ruivo queria dizer que iam jogar a cinquenta créditos cada jogada, ou seja, um euro cada jogada.
«Cinquenta?!..., meu?»
«É só para começar.»
«Não, choninhas» passou a mão pela dorsal atlântica, deveras irritado. «Cento e vinte cinco e depois logo se vê como a gaja reage.»
«Mal.» Disse para os meus botões.
A falsa e insinuante slot estendeu aos jovens o tapete traiçoeiro número um e os resultados foram um êxito. Ajudados por linhas boas no bónus e por duas idas ao cofre, uma das quais culminou em ouro, que lhes rendeu quase quatrocentos e cinquenta euros, em breve estavam a ganhar à volta de novecentos euros. Já era uma ajuda para amortizar os juros daquele mafioso do Ramon que tinha o escritório montado no último piso, onde eram as mesas de jogo. A inspetora que uma vez recebeu o Mário confirmou a existência dessa rede de marginais e lamentou-se, resignada, que nada podia fazer.
«Cinquenta?!..., meu?»
«É só para começar.»
«Não, choninhas» passou a mão pela dorsal atlântica, deveras irritado. «Cento e vinte cinco e depois logo se vê como a gaja reage.»
«Mal.» Disse para os meus botões.
A falsa e insinuante slot estendeu aos jovens o tapete traiçoeiro número um e os resultados foram um êxito. Ajudados por linhas boas no bónus e por duas idas ao cofre, uma das quais culminou em ouro, que lhes rendeu quase quatrocentos e cinquenta euros, em breve estavam a ganhar à volta de novecentos euros. Já era uma ajuda para amortizar os juros daquele mafioso do Ramon que tinha o escritório montado no último piso, onde eram as mesas de jogo. A inspetora que uma vez recebeu o Mário confirmou a existência dessa rede de marginais e lamentou-se, resignada, que nada podia fazer.
Nada podia fazer?
Pois, a ondulação era perigosa.
«Tiramos?» perguntou o tímido.
«Deixa crescer» sentenciou o da crista. «Esta ainda não acabou de vomitar. Vou passar para duzentos.»
«Tu é que sabes.»
Mário sentiu vontade de interferir, mas acabou por bem encolher os ombros.
«Que se lixem. Espero que os estúpidos aprendam de vez a lição...»
Em pouco tempo o software esticou o tapete que ficou sem uma ruga. Era inevitável a máquina fechar-se. Assim, surgiu uma série ruim e os resultados negativos foram imediatos.
«Eu bem dizia...»
«Cala-te, meu. Sei muito bem o que estou a fazer.»
«Já estamos a perder cem» disse o ruivo. «E se jogássemos a 15x10 (1)?»
O assumido chefe do grupo virou-se para trás e disse:
«Merda. Estamos nisto os quatro ou alguém quer desistir?»
Silêncio absoluto.
«Então vamos em frente. Melhor ainda. Jogamos 21x10.»
«Endoideceram de vez!» pensou Mário.
Talvez não. Ultrapassaram os quinhentos euros de lucro em pouco tempo. Agora era o tempo de pensarem no estafado atributo da máquina que era "dar com uma mão e tirar com a outra". Mas estavam tão entusiasmados que não deram pelo segundo fecho da máquina. Ainda estavam na fase do canto da sereia e foram apanhados que nem uns patos que na realidade eram e o descalabro foi.
total. Perderam a segunda oportunidade que a Cleopatra lhes deu (coisa rara!) e mais de mil euros.
«Estamos feitos. Tinha cá uma fé!»
«Pois. Não me deste razão...»
«Cala-te, pedaço de asno.» Voltou-se para trás. «Quanto temos ainda, malta?»
«Nada, meu. Nicles.» Disse o ruivo.
«Amanhã é mais um dia. Tenho uns guitos a receber. Amanhã, Manolo, vens à abertura do casino e apanhas a máquina.»
«Vê lá onde te metes!»
«Não há problema. Se engoliu o nosso guito temos que a fazer vomitar. E tu, Ludgero, trata de vender uns pacotitos.»
«Certo. E se ela vomita logo à noite?»
«Ela, quem?»
«A merda da máquina, meu! Tanto pior para nós. Mas não há nada como tentar. Desta vez sacamos a porra do ticket mal o saldo chegue aos oitocentos.»
«Porquê oitocentos?»
«Apeteceu-me. Agora vamos embora.»
A tragédia caíra sobre o grupo dos quatro. Tiveram dois momentos de glória, mas não os souberam aproveitar.
Voltariam talvez no dia seguinte, trazidos pelo mesmo sonho. Não o sonho da bola colorida que o Gedeão criou. Sim um outro sonho que se esfuma num curto espaço de tempo, como a onda que beija as areias da praia e morre para dar lugar a outra. Poética a frase para um desfecho dramático.
«A filha da puta desta máquina não dá nada!»
«Então, menina Flora, há aqui crianças...»
«Tiramos?» perguntou o tímido.
«Deixa crescer» sentenciou o da crista. «Esta ainda não acabou de vomitar. Vou passar para duzentos.»
«Tu é que sabes.»
Mário sentiu vontade de interferir, mas acabou por bem encolher os ombros.
«Que se lixem. Espero que os estúpidos aprendam de vez a lição...»
Em pouco tempo o software esticou o tapete que ficou sem uma ruga. Era inevitável a máquina fechar-se. Assim, surgiu uma série ruim e os resultados negativos foram imediatos.
«Eu bem dizia...»
«Cala-te, meu. Sei muito bem o que estou a fazer.»
«Já estamos a perder cem» disse o ruivo. «E se jogássemos a 15x10 (1)?»
O assumido chefe do grupo virou-se para trás e disse:
«Merda. Estamos nisto os quatro ou alguém quer desistir?»
Silêncio absoluto.
«Então vamos em frente. Melhor ainda. Jogamos 21x10.»
«Endoideceram de vez!» pensou Mário.
Talvez não. Ultrapassaram os quinhentos euros de lucro em pouco tempo. Agora era o tempo de pensarem no estafado atributo da máquina que era "dar com uma mão e tirar com a outra". Mas estavam tão entusiasmados que não deram pelo segundo fecho da máquina. Ainda estavam na fase do canto da sereia e foram apanhados que nem uns patos que na realidade eram e o descalabro foi.
total. Perderam a segunda oportunidade que a Cleopatra lhes deu (coisa rara!) e mais de mil euros.
«Estamos feitos. Tinha cá uma fé!»
«Pois. Não me deste razão...»
«Cala-te, pedaço de asno.» Voltou-se para trás. «Quanto temos ainda, malta?»
«Nada, meu. Nicles.» Disse o ruivo.
«Amanhã é mais um dia. Tenho uns guitos a receber. Amanhã, Manolo, vens à abertura do casino e apanhas a máquina.»
«Vê lá onde te metes!»
«Não há problema. Se engoliu o nosso guito temos que a fazer vomitar. E tu, Ludgero, trata de vender uns pacotitos.»
«Certo. E se ela vomita logo à noite?»
«Ela, quem?»
«A merda da máquina, meu! Tanto pior para nós. Mas não há nada como tentar. Desta vez sacamos a porra do ticket mal o saldo chegue aos oitocentos.»
«Porquê oitocentos?»
«Apeteceu-me. Agora vamos embora.»
A tragédia caíra sobre o grupo dos quatro. Tiveram dois momentos de glória, mas não os souberam aproveitar.
Voltariam talvez no dia seguinte, trazidos pelo mesmo sonho. Não o sonho da bola colorida que o Gedeão criou. Sim um outro sonho que se esfuma num curto espaço de tempo, como a onda que beija as areias da praia e morre para dar lugar a outra. Poética a frase para um desfecho dramático.
«A filha da puta desta máquina não dá nada!»
«Então, menina Flora, há aqui crianças...»
«Crianças?»
A dita menina Flora sobressaltou-se e olhou para trás. Por momentos julgou que um fiscal estava a admoestá-la. Mas não. Era o Salgado, utente habitual do casino que costumava jogar forte.
«É verdade, senhor Salgado. Esta gaja nem sequer me deixa ir ao cofre. Já joguei a quinhentos e nada. A puta está fechada.»
À esquerda da Flora estava o Zé dedilhador que, entretanto, sorrira com cinismo, talvez com as asneirices da Flora. Por sinal estava no cofre, coisa rara e nunca vista. Ou talvez ao contrário.
Afinal a Flora ainda reparou no último sorriso do parceiro do lado. Não refilou porque o outro era bruto como as casas. Mas disse, entre dentes:
«Vêm cá jantar à borla e ainda se fartam de tirar prémios...»
Depois de passar por tempos dourados entre 2012 e 2017, o Zé entrou em depressão. Mas agora estava a levantar cabeça. Mudança de protetor? Mais que certo. Vá lá saber-se quem. Havia muito por onde escolher.
«São os últimos dez euros que te dou. Desaparece. Mas antes diz à menina para trazer-me um whisky. Um whisky velho. Mas mais novo que tu. Puta de merda de máquina! Estou farta de meter notas nela e continua na mesma.»
O companheiro da Flora recebeu os dez euros e obedeceu de imediato. Tinha começado uma espécie de peça de teatro sem "ponto".
Estabeleceu-se logo a seguir um diálogo tipo Ionesco, botando palavra o "doutor" que jogava na máquina da direita. Na seguinte jogava a Felismina, uma mulher controlada e atormentada. Mas de vez em quando também largava as suas bocas. E ó que bocas! Mas não era o seu dia.
«Então, está a mandar embora o seu marido?»
«Qual marido?» perguntou a Flora, subindo de tom a voz. «O chulo deste velho só me está a pedir dinheiro em vez de ser eu a pedir a ele.»
A dita menina Flora sobressaltou-se e olhou para trás. Por momentos julgou que um fiscal estava a admoestá-la. Mas não. Era o Salgado, utente habitual do casino que costumava jogar forte.
«É verdade, senhor Salgado. Esta gaja nem sequer me deixa ir ao cofre. Já joguei a quinhentos e nada. A puta está fechada.»
À esquerda da Flora estava o Zé dedilhador que, entretanto, sorrira com cinismo, talvez com as asneirices da Flora. Por sinal estava no cofre, coisa rara e nunca vista. Ou talvez ao contrário.
Afinal a Flora ainda reparou no último sorriso do parceiro do lado. Não refilou porque o outro era bruto como as casas. Mas disse, entre dentes:
«Vêm cá jantar à borla e ainda se fartam de tirar prémios...»
Depois de passar por tempos dourados entre 2012 e 2017, o Zé entrou em depressão. Mas agora estava a levantar cabeça. Mudança de protetor? Mais que certo. Vá lá saber-se quem. Havia muito por onde escolher.
«São os últimos dez euros que te dou. Desaparece. Mas antes diz à menina para trazer-me um whisky. Um whisky velho. Mas mais novo que tu. Puta de merda de máquina! Estou farta de meter notas nela e continua na mesma.»
O companheiro da Flora recebeu os dez euros e obedeceu de imediato. Tinha começado uma espécie de peça de teatro sem "ponto".
Estabeleceu-se logo a seguir um diálogo tipo Ionesco, botando palavra o "doutor" que jogava na máquina da direita. Na seguinte jogava a Felismina, uma mulher controlada e atormentada. Mas de vez em quando também largava as suas bocas. E ó que bocas! Mas não era o seu dia.
«Então, está a mandar embora o seu marido?»
«Qual marido?» perguntou a Flora, subindo de tom a voz. «O chulo deste velho só me está a pedir dinheiro em vez de ser eu a pedir a ele.»
Estava a falar verdade, ou o velho já lhe dera alguma coisa e mais que essa coisa e ela queria que lhe desse tudo?
«Então que é feito do outro seu amigo que vi da outra vez?»
«Então que é feito do outro seu amigo que vi da outra vez?»
A Flora olhou para ele muito séria. Tempestade inevitável?
Não. O tiro num navio de quatro canos foi demasiado subtil.
«Esse infeliz já morreu. Agora tenho este. É velho.»
«Ah sim?»
«Como é que acha que governo o vício? Ah... chegou o whisky. É velho, menina?»
«Não lhe perguntei a idade.»
E afastou-se.
«Estas gajas! Viu isto, senhor Salgado?»
E emborcou meio whisky do copo.
«Já matou dois» afirmou este. «Quem agora está consigo goza de saúde? Preciso de mais "hóspedes" para o meu trabalho.»
«Que trabalho?»
«Ora, bem sabe...»
«Pois. Este diz que já não tem cheta. Mas mente. Pelo sim, pelo não, ando à procura de um rico. Por acaso conhece a danceteria perto das Caldas?»
«Eu não. Já estou bem servido.»
«Ó se estás!» comentou o Zé dedilhador que estava de novo no cofre e preparava-se para ir ao ouro.»
«Não gosto de insinuações. Vê lá se te cai um dente,»
«Esse infeliz já morreu. Agora tenho este. É velho.»
«Ah sim?»
«Como é que acha que governo o vício? Ah... chegou o whisky. É velho, menina?»
«Não lhe perguntei a idade.»
E afastou-se.
«Estas gajas! Viu isto, senhor Salgado?»
E emborcou meio whisky do copo.
«Já matou dois» afirmou este. «Quem agora está consigo goza de saúde? Preciso de mais "hóspedes" para o meu trabalho.»
«Que trabalho?»
«Ora, bem sabe...»
«Pois. Este diz que já não tem cheta. Mas mente. Pelo sim, pelo não, ando à procura de um rico. Por acaso conhece a danceteria perto das Caldas?»
«Eu não. Já estou bem servido.»
«Ó se estás!» comentou o Zé dedilhador que estava de novo no cofre e preparava-se para ir ao ouro.»
«Não gosto de insinuações. Vê lá se te cai um dente,»
Quem desse conta da passada curta e pausada do Zé dedilhador, quando se transformava em abutre dissimulado a saltar para a máquina certa, achava bem metida a outra sua alcunha. Senhor dos Passos.
«Só se forem os da placa de cima. Acho que está larga.»
«Há muitas mulheres lá. E bonitas como eu.» Informou a Flora.
«Oh! Oh! Oh!»
«Que se passa, dona Felismina?»
«Nada nada. Deixei cair no chão um ticket. Por acaso tem uma pastilha para a tosse?»
Esqueceu-se da graçola da Felismina e virou-se para o Salgado.
«Precisa de ir lá. Amanhã vou encontrar-me com um gajo rico. Dou-lhe boleia.»
«Depois, mata-o.»
Bebeu o resto do whisky.
«Puta da máquina. Já viu? Ora, só assim posso cá vir.»
Referia-se aos amigos ricos.
«Faça-o depressa.»
«Porquê?»
«Porque sim.»
«Não está a ver, Flora?» perguntou o Zé com um certo sarcasmo na voz.
«Não. Ah, já chegaste» virou-se para o velho. «Livra-te de pedir mais dinheiro. Olha, joga aqui enquanto eu vou jantar. Só gosto de comer de faca e garfo. Mas joga baixinho. Ai de ti, que te esgano!»
O velho nem sequer pestanejou.
«E que eu venha e tu não estejas aqui!»
«Felismina. Repara que estás a jogar muito alto. Baixa para catorze.» Falou, entre dentes, o marido opressor.
Faltava ainda o último ato desta curta peça. Não tardaram as pancadas de Molière.
«Olha... que sorte, Manolo! Logo à primeira, um leão e dois cavalos. A outra máquina estava uma merda.»
«Vamos atacar em força. A duzentos?»
E a sociedade dos quatro jogadores começou a atacar em força. A máquina foi dando e tirando, como se estivesse estudando o jogador. Até parecia humana.
«Porra, esta merda não está a dar para o petróleo.»
«Tem calma» disse o ruivo. «Ainda agora chegámos.»
«Fomos ao cofre!» avisou.
«Joga depressa. O cobre está a sessenta e tal.»
«Porra! Logo à primeira. Vinte euros. Vocês não me disseram que estava um sacana à janela.»
O Tiago queria dizer que havia outra máquina com o cofre aberto, cujo utente, antecipando-se, arrecadou os sessenta e tal euros.
Mas logo a seguir aconteceu algo bom que provocou uma gritaria dos quatro. E não era caso para menos. Tinha saído uma boa linha. Mas...
«Eu estava a jogar nessa máquina.»
Era o velho que entretanto chegara de trocar dinheiro.
«Como?» perguntou o Tiago, irritado. «A máquina não estava marcada.»
«Mas tinha créditos.»
«A merda de três cêntimos? Chama o fiscal, ó velhadas. Queres levar um murro no alto da cabeça?»
«Tira já o ticket, Tiago. A linha deu novecentos euros.»
«Pois tiro. Espera aí e depois vai trocar. Tem que ser ao balcão, ouviste?»
«Só se forem os da placa de cima. Acho que está larga.»
«Há muitas mulheres lá. E bonitas como eu.» Informou a Flora.
«Oh! Oh! Oh!»
«Que se passa, dona Felismina?»
«Nada nada. Deixei cair no chão um ticket. Por acaso tem uma pastilha para a tosse?»
Esqueceu-se da graçola da Felismina e virou-se para o Salgado.
«Precisa de ir lá. Amanhã vou encontrar-me com um gajo rico. Dou-lhe boleia.»
«Depois, mata-o.»
Bebeu o resto do whisky.
«Puta da máquina. Já viu? Ora, só assim posso cá vir.»
Referia-se aos amigos ricos.
«Faça-o depressa.»
«Porquê?»
«Porque sim.»
«Não está a ver, Flora?» perguntou o Zé com um certo sarcasmo na voz.
«Não. Ah, já chegaste» virou-se para o velho. «Livra-te de pedir mais dinheiro. Olha, joga aqui enquanto eu vou jantar. Só gosto de comer de faca e garfo. Mas joga baixinho. Ai de ti, que te esgano!»
O velho nem sequer pestanejou.
«E que eu venha e tu não estejas aqui!»
«Felismina. Repara que estás a jogar muito alto. Baixa para catorze.» Falou, entre dentes, o marido opressor.
Faltava ainda o último ato desta curta peça. Não tardaram as pancadas de Molière.
«Olha... que sorte, Manolo! Logo à primeira, um leão e dois cavalos. A outra máquina estava uma merda.»
«Vamos atacar em força. A duzentos?»
E a sociedade dos quatro jogadores começou a atacar em força. A máquina foi dando e tirando, como se estivesse estudando o jogador. Até parecia humana.
«Porra, esta merda não está a dar para o petróleo.»
«Tem calma» disse o ruivo. «Ainda agora chegámos.»
«Fomos ao cofre!» avisou.
«Joga depressa. O cobre está a sessenta e tal.»
«Porra! Logo à primeira. Vinte euros. Vocês não me disseram que estava um sacana à janela.»
O Tiago queria dizer que havia outra máquina com o cofre aberto, cujo utente, antecipando-se, arrecadou os sessenta e tal euros.
Mas logo a seguir aconteceu algo bom que provocou uma gritaria dos quatro. E não era caso para menos. Tinha saído uma boa linha. Mas...
«Eu estava a jogar nessa máquina.»
Era o velho que entretanto chegara de trocar dinheiro.
«Como?» perguntou o Tiago, irritado. «A máquina não estava marcada.»
«Mas tinha créditos.»
«A merda de três cêntimos? Chama o fiscal, ó velhadas. Queres levar um murro no alto da cabeça?»
«Tira já o ticket, Tiago. A linha deu novecentos euros.»
«Pois tiro. Espera aí e depois vai trocar. Tem que ser ao balcão, ouviste?»
«Bem sei.»
«Então, você chama o fiscal ou não?»
Mas já estava a falar para o boneco. O velho tinha dado de frostes.
«O homem estava a guardar o lugar da companheira.» Esclareceu o doutor.
«Mas aqui guardam-se lugares?»
Tudo serenou e o grupo dos quatro jovens voltou ao jogo. Foi então que chegaram a Flora e os seus seios. Vinha acompanhada de um fiscal e do velho.
Mas já estava a falar para o boneco. O velho tinha dado de frostes.
«O homem estava a guardar o lugar da companheira.» Esclareceu o doutor.
«Mas aqui guardam-se lugares?»
Tudo serenou e o grupo dos quatro jovens voltou ao jogo. Foi então que chegaram a Flora e os seus seios. Vinha acompanhada de um fiscal e do velho.
«O que é que aconteceu?» perguntou o fiscal.
Como é natural, deu-se início a um diálogo a três em que o fiscal serviu principalmente de moderador e ouviu o que conseguiu ouvir porque o Tiago e a Flora gritavam o mais alto que podiam.
O que se passou entretanto e diz respeito ao último ato da peça de teatro não é incluído aqui porque a censura decidiu cortar, visto não ser recomendável ouvir.
É assim que vai esta amostra do eclético nível que se respira nestes casinos do nosso querido Portugal à beira-mar plantado. E momentos como estes não são raros. Digamos que estão cada vez mais na moda.
Que saudades tenho dos tempos do Teodoro!
«Quem é o cabrão desse tal Teodoro?»
«Vai mais um whisky, Flora?»
O que se passou entretanto e diz respeito ao último ato da peça de teatro não é incluído aqui porque a censura decidiu cortar, visto não ser recomendável ouvir.
É assim que vai esta amostra do eclético nível que se respira nestes casinos do nosso querido Portugal à beira-mar plantado. E momentos como estes não são raros. Digamos que estão cada vez mais na moda.
Que saudades tenho dos tempos do Teodoro!
«Quem é o cabrão desse tal Teodoro?»
«Vai mais um whisky, Flora?»
A Flora sempre ficou com a máquina, mas só depois do grupo dos quatro ficar sem cheta. Acontecimento que não demorou muito tempo.
(1) Num máximo de vinte e cinco linhas, jogariam a dez minhas com o multiplicativo 15. Por exemplo, se uma jogada desse um crédito de trinta pontos, esse crédito viria multiplicado por quinze (portanto, 450 pontos).

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